quarta-feira, 25 de março de 2009

A LITERATURA EM SI - urtiga! nº1

O fenômeno literário perpassa tanto as módicas apreciações quanto as mais entusiásticas pesquisas bibliográficas de caráter acadêmico. Embora muitos acreditem que literatura só se faz dentro dos portões das universidades, muitas vezes, é num espaço alheio a essas vivências que ela se manifesta. Seja por pessoas que vivem exclusas ao ambiente dito de pesquisa, ou por aqueles que simplesmente lêem antes de dormir algum conto ou poema que os afeta e abala, a literatura expande os mundos das criações e se (re)faz nas considerações dos que a têm (mesmo que não saiba que seu nome conceitual é esse) como meio de vida, de encarar o mundo e contemplar as possibilidades de outrem vigoradas ou exteriorizadas em palavras.
Muitos dos leitores ignoram a sistematização embrenhada em chãos conceituais, muitos deles mantêm a leitura por hábito (ou vício) de ver e sentir nas palavras dos criadores (iguais a nós!) uma razão e lugar no mundo, ou, pelo contrário, um desdizer da fonte que a tantos arrebata; um não estar só antes às peripécias que o mundo e a vida nos dão, ou puramente se largam à tarefa de sentir com exclusiva fruição muito do que é visto como imposição nas salas universitárias. A literatura existe, de fato, como meio de vida, como possibilidade. Conversamos com pessoas totalmente fora do ambiente em que se professa a arte sistematizada e delas tiramos as mais entusiásticas considerações sobre obras literárias que ninguém lhas impôs. O problema me parece, é que muitos dos que estudam a literatura pensam que ela é o didatizar da poesia (por exemplo) como arte de gente morta, como um passado que se quer presente por um saudosismo extremado, não atentando a pura realidade de que literatura é viva, é vida e está em tudo.
Pensar na literatura e na disseminação do pensamento não é menosprezar o empenho científico que a ela damos, mas nos prender às correntes de um “quê” pré-estabelecido de verdades guardadas por profetas detentores do “real” saber, da “real” maneira de se fazer poesia (e literatura em geral) é maximizar a falácia de que tudo que é bom já foi feito, de que vivemos num tempo sem esperanças e de que no passado sobrevive o verdadeiro empenho humano de quem ainda se extasiava com coisas mais interessantes que as irracionalidades dos “reality shows”: febre contemporânea de muitos. Pensemos na literatura como dinâmica, como mais uma das expressões do ser humano, e não a limitemos somente às enciclopédias e aos arcabouços livrescos prenhes de formatações, que muitas vezes só a prendem e a deixam parecer um tabu contemplativo, habilidades dos homens de outrora.
A literatura, como a vida, expande o que antes se fez e se refaz a cada leitura que fazemos, basta que nos deixemos mais soltos às nossas vontades de apreciar, não só o inefável, mas o cotidiano e o comum que a literatura também retrata e representa.

Josoel Kovalski
Prof. de Literatura da FAFIUV


Ilustração: Old Man Reading Bible, de V. Van Gogh

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