sábado, 13 de março de 2010

Criação - Contos de minuto, por Katiúscia Silvestri - urtiga! 10

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Katiúscia Silvestri é natural de São Miguel do Oeste, mas vive em Porto União. Cursa Jornalismo na UNIUV (Centro Universitário de União da Vitória), escreve no blog Contos de minuto e participa da antologia 6 pra casar, a ser lançada.
A poesia-prosa de Katiúscia Silvestri, sem exagero, faz lembrar a escrita de Ana Cristina Cesar, no que ela tem de doce e ácida, elíptica e concentrada. «Meia-bruxa, meia-fera, risinho modernista arranhando na garganta, ou mesmo cara-pálida que desconhece o próprio cor-de-rosa», diria a poeta de «A teus pés». Chega de comentários. Vamos aos textos. Neles, nada importa que não seja o corpo, a palavra, os dentes e um filete de sangue escorrendo dos lábios depois do beijo e da mordida. Enfim, uma máquina de fabricar encantos e malícias, gostosuras e travessuras.


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Antes de nascer o dia, barulho de folhas.
Folhas secas de outono, folhas de caderno.
Entreabri os olhos e a vi sentada ao pé da cama, ainda nua,
como se acabasse de sair do banho.
Chovera durante toda a noite. Lá fora, água. No quarto, beijos.
Ela fechou a cortina e eu, os olhos.
Ela vestia a roupa tão rápido quanto eu minhas fantasias.
Nelas, como se escrevesse em nuvens,
escrevia em suas coxas,
tão macias quanto.
Um batom era a caneta. Vermelho, sempre.
E ao final, folhas e corpos riscados, fazia o desenho
de um A. "Com Amor", terminava.
"A", o começo do alfabeto e o fim da carta,
o fim da noite, o fim da chuva,
aqui dentro e lá fora. Ela abria a cortina,
eu não abria os olhos, e ela partia.
A cada segunda-feira, enquanto eu ouvia
o barulho das folhas, ela escrevia.

Boca cor de céu, bochechas encaracoladas, olhos sabor pitanga e cabeleira rosada e de aparência saudável. Alta como o perfume dos lírios e com cheiro de três andares.
Ao andar, flutuava elegante como um caminhão em rodovia esburacada. Certamente era uma deusa. E só eu tive o privilégio de vê-la antes de ser reduzida a chiclete em sola de sapato.

Preciso comprar uma bolsa
Pegar uma faca e rasgar tua cara no meio.
Depois, arrastá-la pelos cabelos e fazer o mesmo com ela. É isso que eu faria se tivesse uma faca quando te visse com ela.
Só não faço porque não tenho bolsa pra esconder a faca.

A banheira transbordando de espuma.
Velas acesas e ela despida.
- Vem cá, meu bem!
E puxou o espelho para mais perto de si.
Imagem: Natália Nunes

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