tag:blogger.com,1999:blog-87808081349212498352024-03-19T03:14:55.711-07:00urtiga!Publicação literária do curso de Letras da FAFIUV (Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras de União da Vitória - PR)Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.comBlogger78125tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-83456918974069964412010-05-04T10:34:00.000-07:002010-05-04T10:38:31.887-07:00jornal urtiga! n° 12 - maio 2010<span style="color:#ffffff;">.</span><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiiurvGlpPq9ytUg6PFSXNGYd-A8YPNYdIbFFZukS-hhXnfNpTkunBRhgtUeoTomPvZj6EKZiVm-QKROVfKr4Q3oK-BladvVS50moiGqCnOBKNVu8l8DxBikVje5wCRJWHGD0wzq_WefX0/s1600/44.jpg"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 237px; DISPLAY: block; HEIGHT: 320px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5467469837748809650" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiiurvGlpPq9ytUg6PFSXNGYd-A8YPNYdIbFFZukS-hhXnfNpTkunBRhgtUeoTomPvZj6EKZiVm-QKROVfKr4Q3oK-BladvVS50moiGqCnOBKNVu8l8DxBikVje5wCRJWHGD0wzq_WefX0/s320/44.jpg" /></a><strong> <span style="font-size:130%;">Colaboradores desta edição:</span></strong><span style="font-size:130%;"><br /><strong></strong><br /><strong>Emili Albuquerque</strong><br /><strong>Jucimara Garbos</strong><br /><strong>Rosana Cavalheiro</strong><br /><strong>Neusa Soares</strong><br /></span><strong><span style="font-size:130%;">Stella Florence<br /></span></strong>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-5161427710602180502010-05-04T10:31:00.000-07:002010-05-04T10:37:59.506-07:00Clarice Lispector e a pintura - urtiga n° 12<span style="color:#ffffff;">.</span><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjg7akqbPaL7PA3g-HnGZ5JQKJfAjAKnyTUd8PfjGw19xPmH7GtDEl78VThXDECWprOuWBF66DlsGqZy7EauLvzddLbKxxWMQ6e5J7_UcRJiYYY9wdF62mCFVX-awUp4_hbcz6Bd3EFogk/s1600/cultura2.jpg"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 138px; DISPLAY: block; HEIGHT: 320px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5467469510986166082" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjg7akqbPaL7PA3g-HnGZ5JQKJfAjAKnyTUd8PfjGw19xPmH7GtDEl78VThXDECWprOuWBF66DlsGqZy7EauLvzddLbKxxWMQ6e5J7_UcRJiYYY9wdF62mCFVX-awUp4_hbcz6Bd3EFogk/s320/cultura2.jpg" /></a><span style="color:#ffffff;"> .</span><br /><div align="justify">Quais são os limites entre a pintura e a literatura? Em que momento as palavras deixam de ser palavras e passam a ser traços e cores? Como pintar um livro ou escrever um quadro? O pintor pinta o que não consegue descrever e o escritor escreve o que não consegue pintar. Medo, Explosão, Tentativa de Ser Alegre ou Caos da Metamorfose sem Sentido, Sobre Medo. Esses são os nomes de alguns dos quadros pintados por Clarice Lispector. Segundo Marcelo Bortoloti, os quadros de Clarice testemunham um período especialmente difícil para a autora: «Em 1975, ela fora demitida do Jornal do Brasil, no qual escrevia crônicas semanais, e estava preocupada com sua situação financeira. Embora ainda não soubesse do câncer que a mataria dois anos depois, sua saúde já estava debilitada. Aos 54 anos, escritora consagrada, ela se dizia cansada da literatura e declarava que pretendia parar de escrever, talvez para sempre. Ao longo desse ano, pintou freneticamente. São obras abstratas, algumas sombrias, outras muito coloridas, todas com nomes trágicos». Em dois de seus romances, Água Viva, de 1973, e o póstumo Um Sopro de Vida, as personagens centrais são artistas plásticas, e há títulos de quadros que foram usados pela autora nas obras que pintou depois. </div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-88274448701110650242010-05-04T10:29:00.000-07:002010-05-04T10:31:35.648-07:00Uma pincelada de cores e palavras - urtiga n° 12<div align="justify"><span style="color:#ffffff;">.</span></div><div align="justify">Para fazer a leitura de Água, Viva, de Clarice Lispector, temos que estar preparados para mergulharmos em uma obra de arte, estando conscientes de que passaremos de leitores a pintores. Devemos estar com todo o material à mão para, juntos de Clarice, finalizarmos essa pintura/escritura.<br />Clarice, nessa obra, tenta escrever tudo o que não consegue pintar. É uma forma de se manter viva: «Eu acho que, quando não escrevo, estou morta». O nome Água Viva é um desejo de unir a arte à vida. E ela nos deixa inquietos, pois consegue entrar em nosso íntimo, deixando tortuosas dúvidas sobre o presente, o «instante-já». Logo no início do livro diz: «O presente me foge, a atualidade me escapa, a atualidade sou eu sempre no já». Em alguns momentos do texto, a narradora tenta fazer pintura com as palavras, como se o ato de escrever exigisse um pincel e a mistura de cores. A palavra exata é uma cor apropriada para a tela: «Não pinto idéias, pinto o mais inatingível "para sempre". Ou "para nunca", é o mesmo. Antes de mais nada, pinto pintura. E antes de mais nada te escrevo dura escritura».<br />Um dos quadros que Clarice pintou ganhou o nome de Gruta. Sobre ele, a narradora comenta: «As grutas são o meu inferno». Há uma angústia na pintura, uma vontade de dizer e não ter palavras, «seu doce horror». Ela sente medo de saber pintar o horror, mas é um horror doce,por isso pinta.<br />Água Viva nos permite ser ao nos fornecer as lacunas de uma narradora fragmentada. Assim, podemos usar o imaginário, conquistando uma autonomia que nos convida a finalizar a obra de arte: «O que te escrevo é um isto. Não vai parar: continua».<br />Clarice Lispector escrevia desde pequena e chegou a confessar: «Quando tinha nove anos, eu vi um espetáculo e, inspirada, em duas folhas de caderno, fiz uma peça em três atos, não sei como. Escondi atrás da estante porque tinha vergonha de escrever».<br />Ela tinha um método de escrita, anotava todas as idéias a qualquer hora, em qualquer pedaço de papel, afinal, as idéias fogem, não é? Sempre com seu estilo intimista buscando entender o que significa «estar no mundo».<br />Numa crônica publicada em 1968 no Jornal do Brasil, ela comenta: «(...) fui preparada para ser dada à luz de um modo tão bonito. Minha mãe já estava doente, e, por uma superstição bastante espalhada, acreditava-se que ter um filho curava uma mulher de uma doença. Então fui deliberadamente criada: com amor e esperança. Só que não curei minha mãe. E sinto até hoje essa carga de culpa: fizeram-me para uma missão determinada e eu falhei. Como se contassem comigo nas trincheiras de uma guerra e eu tivesse desertado. Sei que meus pais me perdoaram por eu ter nascido em vão e tê-los traído na grande esperança. Mas eu, eu não me perdôo». Neste fragmento do livro de crônicas A Descoberta do Mundo, Clarice Lispector nos mostra todo o seu drama particular. Ela veio de uma família judaica, recebendo o nome de Haia, que significa Vida. Terceira filha de Pinkouss e Manica Lispector, natural da Ucrânia, Clarice veio para o Brasil ainda recém-nascida e tornou-se uma das escritoras mais importantes da literatura modernista, junto com Guimarães Rosa, nos anos 60. Seu primeiro romance foi Perto do Coração Selvagem, com o qual ganhou o Prêmio Graça Aranha, no ano de 1944. Clarice Lispector morre no Rio de Janeiro em 9 de dezembro de 1977, um dia antes de completar 57 anos. Carlos Drummond de Andrade, seu amigo, escreveu: «Clarice veio de um mistério, partiu para outro. Ficamos sem saber a essência do mistério ou o mistério não era essencial, era Clarice viajando nele».<br /><br /><em>Jucimara Garbos, graduada em Letras pela FAFIUV; cursando especialização em Língua Portuguesa e Literaturas (FAFIUV)</em></div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-35132680384518543002010-05-04T10:26:00.000-07:002010-05-04T10:29:46.870-07:00Leite Derramado: O clássico torna-se contemporâneo - urtiga n° 12<span style="color:#ffffff;">.</span><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj-AOtEoO_Kief3mOeVQF_HG5BHK1sT5dMyuA7d46txu0Pr20q-YwhNxvWwe-VvZg1ZLI9da0XK5_dXyFOPbm6ATJWlqVXzRyD0AGFKEjlw6Rt9whVhxw4-qjo6_YApL2QZhSt3B1d9xTA/s1600/cover-145965-600.jpg"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 221px; DISPLAY: block; HEIGHT: 320px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5467468243869291986" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj-AOtEoO_Kief3mOeVQF_HG5BHK1sT5dMyuA7d46txu0Pr20q-YwhNxvWwe-VvZg1ZLI9da0XK5_dXyFOPbm6ATJWlqVXzRyD0AGFKEjlw6Rt9whVhxw4-qjo6_YApL2QZhSt3B1d9xTA/s320/cover-145965-600.jpg" /></a><span style="color:#ffffff;"> .<br /></span><div align="justify">Leite Derramado, o mais recente romance de Chico Buarque, lançado em 2009, pela Companhia das Letras, conta a história de Eulálio da Assumpção, homem de estirpe que, ao completar cem anos, se vê numa simples cama de hospital, dependente de todos à sua volta. Entre lapsos de memórias, Eulálio remonta a sua história, de glamour e decadência, dialogando, aparentemente, com inúmeros interlocutores.<br />O livro tem como narrador o próprio Eulálio, isto é, um narrador-personagem. Este fato nos remete ao célebre Machado de Assis, que utilizou esse procedimento no imortal Memórias Póstumas de Brás Cubas, que apresenta um defunto-autor. Mas não é somente por isso que as duas obras podem ser aproximadas. Machado rompe com narrativa tradicional, construindo um enredo alinear, ou seja, que não segue uma ordem lógica, tampouco cronológica. Assim como Machado, Chico produz uma narrativa caótica, em que o narrador não é mais o senhor de si. Eulálio, ao longo de suas memórias, se torna repetitivo, o que justifica a frase do narrador-personagem quando este faz uma advertência ao leitor, dizendo que “a memória é um grande pandemônio, mas está tudo lá dentro, depois de fuçar um pouco o dono é capaz de encontrar todas as coisas. Não pode alguém de fora se intrometer, como a empregada, que remove a papelada para espanar o escritório. Ou como minha filha que pretende dispor minha memória, na ordem dela, cronológica, alfabética, ou por assunto”.<br />Nesta passagem do livro, fica claro que a narrativa é diferente das histórias tradicionais, por operar constantes quebras em seu enredo. Ao longo de suas memórias, Eulálio narra com orgulho a origem de sua família, mostrando que provém de berço de ouro. Ao mencionar a estreita relação de sua família com personagens marcantes da nossa história, remonta também um panorama histórico e cultural do nosso país.<br />São corriqueiras as reminiscências da infância e principalmente da juventude, época em que Eulálio conhece seu grande amor, Matilde, moça que embora tendo a cor desta terra, é do meio social do jovem. A moça o cativa de forma incontestável.<br />A presença de Matilde é constante nos relatos de Eulálio. Ora divinizada, ora condenada por seus atos, sua figura é marcante e prevalece, de maneira que, em alguns momentos, parece mais ser um tormento que lembrança. Mas é evidente que, apesar de abandoná-lo, Matilde permanece sendo seu grande amor.<br />Outro fato relevante é a figura do pai, que aparece sempre mencionado como homem de posses, de contatos influentes, ligado à política, e que tem uma vida social bastante agitada, bem como várias amantes. Este último fato, a princípio, torna-se o motivo mais provável de sua morte trágica. A cena do pai estendido num tapete, morto, quando Eulálio ainda era jovem, por vezes se torna um fardo doloroso, um suplício.<br />É típico Eulálio intercalar ou interromper suas memórias para dialogar com algum interlocutor, pois ao mesmo tempo em que conta seu passado, narra seu presente. Suas lembranças ora se repetem, ora se confundem, formando um grande labirinto. Nem mesmo ele consegue explicá-las com discernimento.<br />Os interlocutores, a filha e os funcionários do hospital, aos quais Eulálio se refere ao longo do texto, e que por vezes trava diálogos, parecem não ouvi-lo. O fato é que temos a impressão de que esses diálogos não passam de desvarios do narrador. Dessa maneira, a narrativa de Chico Buarque se insere numa linhagem da literatura contemporânea que valoriza um narrador paranóico - como o narrador de Bêbados e Sonâmbulos, de Bernardo Carvalho -, um narrador desterritorializado, para usar uma expressão de Gilles Deleuze.<br />Observe: “Nem sei por que você me alivia a dor. Todo dia a senhora levanta a persiana com bruteza e joga o sol no meu rosto”. O narrador se refere à filha. O intrigante é que a filha não reage ao comentário e continua a agir normalmente.<br />Mais adiante: “Quando sair daqui, vamos começar vida nova numa cidade antiga, onde todos se cumprimentem e ninguém nos conheça. Vou lhe ensinar a falar direito, a usar os diferentes talheres e copos de vinho, escolherei a dedo seu guarda-roupa e livros sérios para você ler. Sinto que você leva jeito porque é aplicada, tem meigas mãos, não faz cara ruim nem quando me lava, em suma, parece uma moça digna apesar da origem humilde».<br />Desta vez, o discurso é proferido a uma enfermeira.<br />Em outra passagem, o narrador confidencia à filha:<br />“Não vou mentir, tive outras mulheres depois dela, levei mulheres para cama. E quando a babá Balbina ouvia nosso bulício, saía com você para a praia, mesmo à noitinha, às vezes debaixo de chuva.” Ou ainda: “Tragam-me por obséquio a minha goiabada”.<br />Percebemos que esses diálogos nada mais são do que meros comentários pensados e não ditos. Os interlocutores, em nenhum momento, reagem a esse diálogo, o que torna válida a hipótese de que o narrador dialoga consigo mesmo, e mais, que as lembranças não passam de devaneios de Eulálio, devido à sua saúde debilitada.<br />Realmente, as semelhanças com Brás Cubas existem. Vejo a obra de Machado sendo reinventada por Chico. A literatura nada mais é do que a arte de reinventar a realidade e a própria tradição literária. Também não me assusto com o o fato de um cantor como Chico Buarque produzir um livro como esse. Leite Derramado marca um ponto em que o velho pode se tornar contemporâneo, mostrando-nos a riqueza de nossa literatura.<br /><br /><br /><em>Rosana Cavalheiro, cursando especialização em Língua Portuguesa e respectivas Literaturas, na FAFIUV.</em></div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-75251092914722916262010-05-04T10:24:00.000-07:002010-05-04T10:26:19.845-07:00Gótico: a busca pelo Grotesco - urtiga! n° 12<span style="color:#ffffff;">.</span><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiaRspqTOTYk9LsAi76eIhcg39HX4vc7QGLK2XhzJgNPYdhuRoIXhdVIOyTpRVb-MetYW07MxoNhHISVaYoEpli-aV2nXJKbKnEP5UDOVFLzUofjzxDFZMx3kC0M0K8uHV7ah2_t8zQCXM/s1600/Cathedral_of_Amiens_front.jpg"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 240px; DISPLAY: block; HEIGHT: 320px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5467467367567049954" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiaRspqTOTYk9LsAi76eIhcg39HX4vc7QGLK2XhzJgNPYdhuRoIXhdVIOyTpRVb-MetYW07MxoNhHISVaYoEpli-aV2nXJKbKnEP5UDOVFLzUofjzxDFZMx3kC0M0K8uHV7ah2_t8zQCXM/s320/Cathedral_of_Amiens_front.jpg" /></a><span style="color:#ffffff;"> .<br /></span><div align="justify">O vício. O obscuro. O pagão. O grotesco. A morte. O paroxismo plangente diante do amor impossível: seja a virgem imaculada ou a devassa insaciável; o príncipe num cavalo branco ou o Don Juan tuberculoso que, ébrio, desvirtua as moçoilas da corte.<br />Todos esses temas sôfregos que levariam qualquer mortal ao arrasto do sofrimento exercem, ao invés de uma repulsa, uma atração curiosa, uma sedução compulsiva que é incessantemente retratada em várias obras artísticas – de esculturas medievais até os contos marginais publicados em blogs na internet.<br />Mas por que essa exaltação torturante continua a ser representada? Por que, apesar da incômoda sensação diante desses tabus sociais, artistas insistem em tocar nas feridas da psique? E mais que isso, cometer o despautério de chamar o grotesco de Arte?<br />A Arte pode ser sintetizada, em sua essência, na busca pelo Belo. A busca pela beleza e a melhor forma de ser exaltada fazem parte do universo de preocupações humanas. A busca pelo Belo é eterna na Arte. Mas como pode ser definido o “Belo”? O que é essa exaltação?<br />Temos a associação Socrática do Belo ao que é útil e confortável. Contrapondo-se a esse sentido prático Platão defende a busca de um Belo que não tenha como finalidade uma utilidade, mas que corresponda a um ideal de beleza que se encontre nas coisas, significando que os objetos somente serão Belos na medida em que se enquadrem do ideal de beleza, que é perfeito, imutável, atemporal e além da dimensão material. Aristóteles, contrapondo-se a Platão e a toda a sua questão utópica, procura o belo na mimese da realidade, tanto que afirma: “A tendência para a imitação é instintiva no homem, desde a infância”.<br />Tão diversa é a conceituação do Belo quanto às expressões estéticas traduzidas em milênios de produções artísticas. Tão variável é o pensamento humano quanto as suas eras, suas regiões, crenças, enfim, suas culturas.<br />A expressão é por si só a Arte. E a expressão do lado negro do coração humano não poderia deixar de existir, visto que todos os corações pulsam com um lado maligno, com uma agonia que não pode ser sufocada por padrões de harmonia, claridade e felicidade por vezes inatingíveis. O mito da família perfeita, da vida e do emprego harmonioso, da eterna sensação do mar de rosas; tudo é substituído pelo vazio interno, pelo destino irrefutável da morte – e a morte é o tabu, é a putrefação, é o fim da consciência a qual todos nós estamos fadados.<br />Conclui-se, assim, que o senso estético Obscuro existe porque o tabu é o próprio medo transvertido de preconceito, e o medo é característica de todo e qualquer ser vivo desenvolvido. Os animais têm medo, ou pelo menos demonstrações de medo como tentativa de fuga e/ou defesa. O medo faz parte do instinto. E o medo vem justamente do risco iminente da morte. E a morte suscita uma série de pensamentos, sentimentos, tudo o que lembrar “bizarro, macabro, sujo, pecaminoso”. Dessa forma, o medo da morte exerce uma sedução hipnótica quando está na questão central de uma obra artística. Justamente porque desperta os instintos ainda animalescos que a humanidade sempre fez questão de ocultar. O Obscuro, no sentido de um Belo oculto, é misterioso e grotesco como a própria morte.<br />Aliado ao poder instintivo do medo, temos a curiosidade e, mais além, temos a criatividade. O ser humano utiliza seu poder de raciocínio e desperta o seu lado lúdico para transformar uma obra da exaltação ao grotesco em um Belo de proporções únicas.<br />Fatos sociais – como guerras, disseminações de doenças mortais, descrenças políticas, pessoais e filosóficas – também serviram como gênese para que o instinto do horror fosse despertado e exteriorizado em forma de arte.<br />A utopia de um mundo paradisíaco e sem dores é substituída pela agonia aterradora de uma situação de incertezas e da iminência de uma catástrofe.<br />Assim, essas obras adquirem um tom confessional, com um lirismo mórbido cuja temática gira em torno dessas coisas resultantes de martírios sofridos em épocas conturbadas por ameaças e pesadelos reais.<br />Em muitas obras, em várias épocas, encontramos esse sentimento obscuro – tanto no sentido do próprio Oculto, pois tudo o que é desconhecido causa estranhamento, incômodo, repulsa. Porém, a tendência estética da busca pela morte e a sua veneração, na cronologia literária, dá-se mais especificamente com o desenvolvimento do movimento artístico Romântico (apesar de existirem variadas obras da era Barroca e até mesmo anteriores, que preencheriam todos os requisitos da estética Gótica). Bottin observa que «moralidade e monstruosidade eram duas das marcas do julgamento ateu do século XVIII».<br />Segundo Bottin, «O Cenário natural, por exemplo, foi sendo percebido de maneira diferente. Montanhas, uma vez consideradas feias como cicatrizes, deformidades desfigurando as proporções de um mundo que idealisticamente deveria ser uniforme, plano e simétrico, começou a serem vistas com olhos prazerosos diante de sua irregularidade, diversidade e escalas. [...] Reflexão, prostração, horror e regozijo eram as emoções que, acreditava-se, expandiam ou elevavam a alma e a imaginação com um sentido de poder e infinidade. As montanhas eram os objetos centrais da sublimação natural».<br />O Romantismo volta-se, dessa forma, para o lado obscuro do próprio ser e de toda a natureza, nessa ânsia de descobrir e redescobrir o próprio lado negro da vida.<br />Mais além, Snodgrass relembra que «com amostras da literatura pitoresca, conhecimento de aventuras episódicas, e baladas sobrenaturais, a escola gótica retornou para a selva e a arquitetura do passado distante para os sons noturnos e as sombras nas quais ancorou contos de terror».<br />Etimologicamente, trata-se Gótico originalmente como algo que era próprio da tribo bárbara germânica dos Godos, (séc. IV). Conhecidos pela batalha chefiada por Berik, na qual eles realizaram uma cruzada pagã à Roma. Na situação, três navios foram utilizados nos quais os guerreiros eram descendentes dos legendários clãs dos Ostrogodos, Visgóticos e Gepid. O império de Roma temia esses guerreiros, e os monges os identificavam como sendo descendentes de Gog, um chefe bárbaro mencionado na Bíblia. O rei gótico Theodoric fundou seu reino na Itália no ano 448 D. C. Apesar da aristrocracia da Itália e Espanha clamarem por sua descendência gótica, a palavra Gótico tornou-se logo sinônimo de paganismo, terror e escuridão. Como metáfora, o termo Gótico foi usado pela primeira vez no início da Renascença, para designar pejorativamente a tendência arquitetônica, criada pela Igreja Católica, da baixa Idade Média e, por conseqüência, toda produção artística deste período. Assim, a arquitetura foi classificada como gótica, referindo-se ao seu estilo "bárbaro", se comparado às tendências românicas da época: imagens pintadas sem noções aprofundadas de perspectiva e, subjetivamente, corroídas por simbologias fantásticas de santos e mártires. No século XVIII, como reação ao Iluminismo, surge o Romantismo que idealiza uma Idade Média, que na verdade nunca existiu. Durante o Romantismo, a arte Gótica foi valorizada e tornou-se sinônimo de, acima de tudo, inspiração. Podemos dizer que o Romantismo foi, por essa razão, uma Renascença do Gótico.<br />Nesse período o termo Gótico passa a designar também uma parcela da literatura Romântica. Como a Idade Média também é conhecida como "Idade das Trevas", o termo é aplicado como sinônimo de medieval, sombrio, macabro e por vezes, sobrenatural. As expressões Gothic Novel e Gothic Literature são utilizadas para designar este sub-gênero Romântico, que trazia enredos sobrenaturais ambientados em cenários sombrios como castelos em ruínas e cemitérios. Assim, o termo Gothicism, de cunho inglês, é associado ao conjunto de obras da literatura gótica. Em várias artes, o grotesco também inspirou a criação de obras sombrias e inquietantes: Beethoven, com sua Sonata ao Luar, suscita a melancolia íntima – e antes dele Bach, com sua Tocata e Fuga em ré menor para órgão desperta o macabro, inspirando diversas gerações de Fantasmas da Ópera. Isso sem mencionar Saint-Saëns, com sua Dança Macabra, inspirada numa figura medieval na qual figuras cadavéricas dançam alegremente. Assim vemos também na arquitetura e na atual fotografia com técnicas de Photoshop a sedução diante de um mundo misterioso e desconhecido que desperta uma inquietação e uma vontade árdua de produzir mais obras exteriorizando sua inquietação, seu tabu, sua vontade pela vida desvirtuada e pelo fim impiedoso desta.<br />Escritores diversos fizeram sua própria obra escrita com o sangue vertente de suas veias criativas – sejam no movimento Barroco, no Romantismo inspirados por Byron, sejam no simbolismo, sejam nos sites e blogs dedicados à sub-cultura Gótica – o terror, o assustador, o grotesco continuam a amedrontar a mente humana.<br />A Estética obscura nos acompanhará até quando a morte, a guerra, a angústia e a imaginação fizerem parte de nossas vidas.<br /><br />FIM<br /><br /><em>Emili Suani Machado Marcondes de Albuquerque, graduada em Letras pela FAFIUV, cursando especialização em Língua Portuguesa e Literaturas pela FAFIUV.</em></div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-1653321690026517212010-05-04T10:18:00.000-07:002010-05-04T10:37:25.708-07:00ENTREVISTA: Stella Florence - urtiga! n° 12<span style="color:#ffffff;">.</span><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSykkYFNsgqQgwLAmWM2R4z6Ys2GYsrU-4cblJxZPZbE-6OO0a7Bl3xdxkyN0_6eWnTIUfaET0wIxBWAbTEXGpA338Wx5U27MLVics7GL1WscWiKw6loDaU7-3jM3T7Z9TPoV08p_XCMc/s1600/%7BEAFA6BC2-4C58-40B5-B964-FC88F3095889%7D_stella%2520florence.jpg"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 185px; DISPLAY: block; HEIGHT: 320px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5467466580647169346" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgSykkYFNsgqQgwLAmWM2R4z6Ys2GYsrU-4cblJxZPZbE-6OO0a7Bl3xdxkyN0_6eWnTIUfaET0wIxBWAbTEXGpA338Wx5U27MLVics7GL1WscWiKw6loDaU7-3jM3T7Z9TPoV08p_XCMc/s320/%7BEAFA6BC2-4C58-40B5-B964-FC88F3095889%7D_stella%2520florence.jpg" /></a><span style="color:#ffffff;"> .<br /></span><div align="justify"><em>Durante dez anos, Stella Florence trabalhou como secretária executiva. Até que numa tarde chuvosa, olhou ao seu redor no escritório em que trabalhava e se perguntou: "O que é que eu estou fazendo aqui?" O resultado? Stella levantou de sua mesa e foi embora para nunca mais voltar. Pouco depois desse grito de alforria, ela resolveu se dedicar à literatura. Hoje essa escritora paulistana é autora de vários livros, entre eles Por que os homens não cortam as unhas dos pés, Hoje acordei gorda e 32, 32 anos, 32 homens, 32 tatuagens.<br /></em><br /><strong>O que te motivou deixar a profissão de secretária para se dedicar exclusivamente à de escritora?<br /></strong>Talvez seja possível resumir em uma palavra: vocação. Foi um surto da alma: aos 29 anos, eu me levantei, peguei minha bolsa, e fui embora do escritório como um zumbi em transe. Dias depois a ideia de voltar a escrever (coisa que eu fazia não profissionalmente na infância e adolescência) me pareceu óbvia, irrefreável. Por mais absurda que parecesse minha decisão naquele momento, eu nunca tive qualquer dúvida de que a mudança de profissão daria certo. Eu estava envolvida por uma espécie de lucidez espiritual – que poderia facilmente ser con-fundida com loucura, é claro. (risos).<br /><br /><strong>Gostei muito dos contos de Hoje acordei gorda, porém, um me deixou surpresa no início e no fim feliz: «Eva era gorda mesmo». Parece-me que, nesse conto, a mulher é vista de forma estereotipada e no final dá uma alegria, um consolo por, finalmente, alguém afirmar que o natural é ser gordo e os magros é que são os anormais. Poderia comentá-lo?</strong> </div><br /><div align="justify">A ideia desse conto-crônica é brincar com a possibilidade de uma origem gorda para todos nós, já que a queda do paraíso tem similaridades com uma quebra de dieta. É apenas uma brincadeira sobre as teorias esdrúxulas que tecemos em torno das mesas de bar, quando o álcool começa a afetar nosso raciocínio.<br /><br /><strong>E quanto a um assunto bastante polêmico, o aborto, você é contra ou a favor? Quando lemos o conto «A vítima», ficamos com a impressão de que a narradora redime a protagonista Gerda, que praticou um aborto.<br /></strong>É, sou a favor da legalização do aborto, não do aborto em si. Não conheço nenhuma mulher que acorde um dia e pense: “Puxa, eu nunca fiz um aborto na vida, preciso ter essa experiência!”. Portanto, não faz sentido ser a favor de algo que só causa dor à mulher. No entanto, é preciso que haja a legalização para que quem escolher se submeter a ele o faça com condições básicas de saúde. No conto que você cita, um dos meus preferidos, Gerda está morta e se vê amparada por um espírito que crê ser seu anjo da guarda. Ao insistir sobre sua identidade, o espírito que a acompanhava com imenso carinho diz sem nenhuma mágoa: “Eu sou o filho que você optou por não ter”. É uma visão minha: acredito que o amor e a compreensão dos limites e das carências do outro sempre irão vencer a parada.<br /><br /><strong>Alguns críticos como Regina Dalcastagné e Tânia Ramos a consideram uma escritora de auto-ajuda, propensa à prática da literatura conhecida como ¨chick lit¨. O que pensa disso?<br /></strong>Sim, eu sou tida como uma representante brasileira da chamada ¨chick lit¨ (literatura de mulherzinha). Não me preocupam os rótulos, eles são necessários para que você seja identificada num primeiro momento. Carrego os rótulos de escritora de humor, de auto-ajuda, de literatura feminina, de chick lit, de cronista ácida, etc. Como diz uma de minhas tatuagens: “sou várias e todas... verdadeiras”.<br /><br /><strong>Na época em que seu livro de contos Hoje acordei gorda foi publicado, muitas pessoas pensavam que o livro fora escrito por Mário Prata. Você encarou o fato com bom humor?</strong><br />Eu AMEI! Foi o melhor presente que uma escritora iniciante, como eu era na época, poderia receber. Imagine alguém que você admira e respeita muitíssimo fingir que escreveu seu livro e ainda dizer “este é meu melhor livro”. Eu babei de orgulho! Tenho convicção que, no Hoje Acordei Gorda, o Mario Prata, genial como sempre, criou um dos melhores prefácios da literatura.<br /><br /><strong>Quais seus livros de cabeceira e qual está lendo no momento? E seus autores preferidos, poderia comentar sobre eles?<br /></strong>Para não estender demais a resposta, vou centralizar em dois dos meus preferidos: sou apaixonada pelo Gabriel García Márquez e pelo Tennessee Williams. Acho “Um bonde chamado desejo” (de T.W.) uma peça brilhante que consegue, através de duas personagens (Blanche e Stella), abordar quase todos os aspectos do feminino. Já Gabo (leio tanto Gabriel García Marquez que me sinto íntima do escritor colombiano a ponto de chamá-lo pelo apelido) é imbatível na maneira como aborda o amor e o sexo. Ninguém fala de sexo como Gabo (isso para não falar no aspecto jornalístico e mágico de sua obra espetacular). Quanto a minha cabeceira, o único livro que sempre está lá é o Evangelho Segundo o Espiritismo, de Allan Kardec.<br /><br /><strong>Guimarães Rosa, em suas andanças e viagens como cônsul, embaixador do Brasil, anotava em cadernos cenas, conversas, paisagens, como pretexto na criação de seus personagens. E para você, de onde vem a inspiração?</strong><br />Estou o tempo todo (mesmo que não queira) absorvendo, elaborando e editando tudo o que acontece fora e dentro de mim. Mas eu não faço anotações: se não desenvolvo o texto imediatamente e a ideia desaparece é porque não era uma boa. A ideia boa sempre volta.<br /><br /><em>Entrevista concedida à Neusa Soares, professora da Rede Pública Estadual. Pesquisadora do PDE (Plano de Desenvolvimento Educacional), sob orientação do curso de Letras da FAFIUV.</em></div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-3892201395211013272010-04-06T12:39:00.000-07:002010-05-04T10:18:07.999-07:00jornal urtiga! n°11: Abril 2009<span style="color:#ffffff;">.</span><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEioybVcWidiOa8s0PShhuum5XNlLonxWPmmpNCjKaZTRH1YBppwkz2IyA9lJkVFTJ9twN_Q9rgT51eTpOWV_7xbVHXD0y5cA5a5ws4IPcwcWq9nQAIBjI1B42zNK5B-46hc7o8tMfMSiJI/s1600/Sem+t%C3%ADtulo.jpg"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 232px; DISPLAY: block; HEIGHT: 320px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5467465257430260498" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEioybVcWidiOa8s0PShhuum5XNlLonxWPmmpNCjKaZTRH1YBppwkz2IyA9lJkVFTJ9twN_Q9rgT51eTpOWV_7xbVHXD0y5cA5a5ws4IPcwcWq9nQAIBjI1B42zNK5B-46hc7o8tMfMSiJI/s320/Sem+t%C3%ADtulo.jpg" /></a><span style="color:#ffffff;"> .<br /></span><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhiHKedNI1c8p1Uief4VnzczhC5fra2FHXEPi7S_FMg597O26RAmL6u1C7IE6BGnb6MxAmCwb15tTSD1thvxLTXLm9pJ-xeXuPisY971qG1b9JqaLljoUEEJyUoUczjhrsAWE3sj_lo2C8/s1600/urtiga11.jpg"></a><strong>Colaboradores desta edição:<br /><br />Ângela Semczeszm<br />Caio R. B. Moreira<br />Isaac Newton<br />Nicolas Behr<br />Rovane Gil<br /></strong><br /><br /><div></div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-26668169504189217132010-04-06T12:37:00.000-07:002010-04-06T12:44:17.421-07:00Seja marginal, seja herói: urtiga n°11<span style="color:#ffffff;">.</span><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjKp7RrCIvtwQnIfKNdDEmftfopAW5LgvokTHmb-6m1RMOtGTYaUqsD__dmcly8JHfAxVveNFQULSxUaGMNVegXAkzhdkc-l447y5QiA8RhYNPDE6xxON5kADvJubqlIEtlKBpVw7MY78s/s1600/256_03.jpg"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 218px; DISPLAY: block; HEIGHT: 320px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5457111110890065410" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjKp7RrCIvtwQnIfKNdDEmftfopAW5LgvokTHmb-6m1RMOtGTYaUqsD__dmcly8JHfAxVveNFQULSxUaGMNVegXAkzhdkc-l447y5QiA8RhYNPDE6xxON5kADvJubqlIEtlKBpVw7MY78s/s320/256_03.jpg" /></a><br /><div align="justify"></div><div align="justify"><span style="font-size:85%;"><em>Foto: Hélio Oiticica. Pintor, escultor, artista plástico e performático. Foi um dos inspiradores do movimento tropicalista e também da poesia marginal.</em></span> </div><div align="justify"></div><div align="justify"></div><div align="justify">A capa desta edição é a reprodução de um cartaz elaborado nos anos 60 pelo artista plástico Hélio Oiticica. Intitulado «Homenagem a Cara de Cavalo» (uma alusão ao conhecido criminoso do morro da Mangueira, que foi morto pela polícia naquela época), o cartaz traz a polêmica frase «Seja marginal, seja herói», cunhada pelo próprio artista, uma resposta a frases como «Bandido bom é bandido morto». Acima do slogan, a imagem de Cara de Cavalo morto.<br />A presente edição do urtiga! é dedicada à poesia marginal, uma prática poética marcada pela experimentação e pelo abandono, por parte dos poetas, dos meios tradicionais de circulação das obras. A poesia foi para a praça, para as ruas, para as universidades. Geralmente, os poemas circulavam em cópias mimeografadas, distribuídas de mão em mão. A poesia marginal, mesmo sem consolidar um grupo homogêneo, foi fomentada por poetas que queriam se expressar livremente na época da ditadura militar, buscando caminhos alternativos para a poesia; caminhos que se afastavam tanto da poesia concreta quanto da poesia engajada dos anos 60 e 70. Da «Geração Mimeógrafo», destacam-se poetas como Cacaso, Chico Alvim, Chacal, Ana Cristina Cesar, Nicolas Behr, entre outros.</div><br /><div align="justify"></div><br /><div align="justify"></div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-49326969225421435722010-04-06T12:36:00.000-07:002010-04-06T12:37:21.430-07:00Poesia Marginal, com maiúsculas ou minúsculas?: urtiga n°11<div align="justify">Poesia Marginal, com maiúsculas ou minúsculas? Essa poesia dita marginal, praticada em escala nacional na década de 70, nunca formou um grupo coeso e coerente, uma frente, uma vanguarda. Refere-se a um fenômeno artístico, literário e cultural específico dum país regido, dirigido sem o conceito de democracia, apesar deste conceito albergar muita mentira; os caminhos da “liberdade”, apesar de menos procurados, estão mais “acessíveis”. A vontade de expressar-se aumentou terrivelmente. Mas o que poderiam fazer os poetas nos 70, poetas novo, poetas sem insígnia ainda? Fizeram uma subversão do esquema de produção estabelecido. Como? A faceta mais famosa desta poesia é aquela na qual livrinhos feitos em mimeógrafos, distribuídos ou vendidos com preços simbólicos, permitiam um contato efetivo do poeta com o leitor, uma aproximação real, ao contrário dos poetas de permanência, em grandes editoras. Talvez por isso Marginal, uma afirmação contrária aos moldes pré-estabelecidos, um humanismo que não existe no capitalismo.<br />E a tal da poesia Marginal, tal qual quer boa parte da critica, talvez não tenha mesmo inovado na forma de fazer poesia no universo, e nem quiseram, porém inovaram ao vivenciar o processo de distribuição. Mas a poesia dita marginal foi mais. Além dos mimeógrafos, alguns poetas imprimiam em gráficas, lançavam revistas, livros, inclusive nas editoras convencionais, e em coleções como: Frenesi, Invenção, Nuvem Cigana, Violão de Rua, Navilouca, Almanaque Biotônica Vitalidade, eis alguns nomes de revistas e coleções. No primeiro almanaque Biotônica, o poeta carioca Charles, num poema manuscrito, sintetiza muito do espírito “marginal”: “na festinha xic paparica-se o artista / na rua o escracho é total / a sabedoria tá mais na rua que / nos livros em geral / (essa é batida mas batendo é que faz render )”. Neste trecho, sente-se bem o clima que vivenciavam, traziam para os poemas as experiências de vida, e levavam para vida experiências poéticas.<br />Paulo Leminski, marginal (bandido que sabe latim), sintetiza o “Ser” da poesia marginal: “marginal é quem escreve a margem / deixando branca a página / para que a paisagem passe / deixando tudo claro a sua passagem / marginal escrever na entrelinha / sem nunca saber direito / quem veio primeiro / o ovo ou a galinha.”.<br />Importante ressaltar que muitos dos poetas “marginais” estavam estudando ou lecionando em universidades, pra deixar claro que essa marginalidade não consistia em condições socioeconômicas ou fatos criminosos (não sei por Platão e pela ditadura). Marginal significa uma saída ao sufoco da repressão, (ironia, humor, cotidiano poetizados, uma atitude de vida), ou seja, não limitarmo-nos com a felicidade imposta. Dissolução, dissidência, exploração de fronteiras, fragmentação, comportamentos descolonizados, eis temas frequentes neste fazer poético. Nomes como Paulo Leminski, Chacal, Waly Salomão, Torquato Neto, Ana Cristina César, Nicolas Behr, Cacaso, Isabel Câmera, Ronaldo Santos, Roberto Schwarz, Pedro Marodin, são muitos dos que atualmente estão sendo resgatados em novas edições. Obras completas, estudos críticos encontram-se disponíveis, atualizando e fazendo reacender o devido espaço que esta geração merece entre nós.<br />«Mãe, só tinha dinheiro pro spray». Pichada em algum muro, alguém sabe o autor? Esta frase aparece num especial de TV, dedicado ao poeta Paulo Leminski. Resume o que o próprio Leminski pensava sobre essa poesia. O gesto é interessante, o processo, a idéia, embora o produto raramente. Sim, numa ditadura isso é até certo ponto válido, o que importa é passar a mensagem, mesmo simplificando, desde que contenha atitude.<br />Tanto faz as iniciais maiúsculas ou minúsculas. A marginalidade entendida enquanto recusa do que vige, sempre perpassou toda Poesia.<br />Aquela ditadura acabou, porém a mídia, massificadora, impõe outra ditadura. Poetas, à margem...<br /><br /><em>Isaac Newton, acadêmico do curso de Letras da FAFIUV</em></div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-66683604292856717082010-04-06T12:33:00.000-07:002010-04-06T18:57:21.535-07:00Cacaso: entre o rigor acadêmico e a brejeirice marginal: urtiga! n°11<span style="color:#ffffff;">.</span><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjmaEFOX3vB_R9sPAFdedK_K3-rFjiH5LxsG-TcePng64qLy1y2UvUDIY2cbKioaKxKCzsWSi8zM-4dvb0h_M4Lh3FzUA_UvLBPwO4f2SbpdTk936cVJplyuGahEvnvTptXWI6fpRsCO70/s1600/cacaso_grande.jpg"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 238px; DISPLAY: block; HEIGHT: 320px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5457110075455729762" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjmaEFOX3vB_R9sPAFdedK_K3-rFjiH5LxsG-TcePng64qLy1y2UvUDIY2cbKioaKxKCzsWSi8zM-4dvb0h_M4Lh3FzUA_UvLBPwO4f2SbpdTk936cVJplyuGahEvnvTptXWI6fpRsCO70/s320/cacaso_grande.jpg" /></a><br /><div align="justify"></div><br /><div align="justify">Antonio Carlos de Brito foi um professor universitário. Cacaso, por sua vez, um dos principais fomentadores da poesia marginal, no Brasil dos 60 e 70. Os dois, a mesma pessoa. Dois em um. O jovem mineiro de cabelos longos e meio hippie, que além de poeta e professor foi compositor, «fez a cabeça» da garotada nas universidades e também fora dela. Depreende-se de seus poemas a concepção de uma poesia irônica e aparentemente despretensiosa, elementos característicos da dita «geração mimeógrafo». Mas até que ponto a sua poesia pode ser considerada fruto apenas de um «desbunde marginal», de uma mera anotação sem pretensões literárias? Não seria ela também fruto de um jogo, proposto por um hábil escritor oriundo da academia?<br />No ensaio inacabado «O Poeta dos Outros» (1988), Cacaso comenta o poema «Almoço», de Francisco Alvim. A cena enfocada pelo poema poderia ser considerada uma mera fotografia do cotidiano, no entanto, Cacaso vê no texto do poeta, meio marginal, meio diplomata, algo mais do que a mera transcrição de uma cena do real. Diz o poema: </div><div align="justify"></div><div align="justify">Sim senhor doutor, o que vai ser? </div><div align="justify">Um filé mignon, um filezinho, com salada de batatas</div><div align="justify">Não: salada de tomates </div><div align="justify">E o que vai beber o meu patrão? </div><div align="justify">uma caxambu</div><div align="justify">(CHICO ALVIM) </div><div align="justify"></div><div align="justify">Para Cacaso, o segredo do poema parece estar na quantidade de experiência que acumula: «Existe toda uma história contida neste «sim senhor doutor» e neste «meu patrão». Algo como a confirmação de um hábito, sua sedimentação, numa síntese de relacionamento em que tudo é transparente: o garçom é o garçom, o freguês é o freguês. Ambos têm os seus comportamentos e as suas falas respectivamente adequados à posição social de cada um. Nota-se, assim, que a aparente singeleza do poema marginal esconde um trabalho «arquitetônico» consciente e singular. A pretensão do poema dá lugar a uma profunda reflexão, não apenas sobre a situação apresentada por Chico Alvim, mas principalmente sobre um recurso que modula os dizeres a partir de uma espécie de simulação de uma anotação, o que acontece em grande parte da produção de Chico Alvim, Cacaso, e outros poetas marginais. E é justamente essa simulação que torna problemática a abordagem desse fenômeno, já que aquilo que simula cria uma espécie de jogo, bem como não se entrega fácil a especulações corriqueiras. O enganar, aqui, é sinônimo de simulação. A aproximação entre poesia e realidade, em Cacaso, deve ser tomada como uma aproximação entre poesia e vida. No poema «Na corda camba», ele come-morava: </div><div align="justify"></div><div align="justify">Poesia </div><div align="justify">eu não te escrevo </div><div align="justify">eu te </div><div align="justify">vivo </div><div align="justify">e viva nós! </div><div align="justify">(CACASO)</div><div align="justify"></div><div align="justify">Mas isso não significa que qualquer fragmento do cotidiano possa ser considerado poesia. É preciso transformá-lo, como um ready-made, já que o real da poesia é sempre uma água que escorre da palma da mão. Barthes, em seu curso «A preparação do romance» desenvolve uma reflexão acerca da relação entre a escrita e o real que pode nos ajudar a entender e problematizar a questão da poesia marginal: "(...) a “literatura” se faz sempre com a “vida”. Meu problema é que não creio ter acesso à minha vida passada; ela está na bruma, isto é, na fraqueza de intensidade (sem a qual não há escritura)".<br />Essa simulação de que falei até agora poderia ser o calcanhar de Aquiles da poesia de Cacaso, justamente porque o poema seria visto como uma mera anotação de uma situação qualquer. Onde estaria a arte? Sua poesia seria entendida apenas como uma mera «brincadeira marginal». No entanto, lembremos que por trás dessa prática há apenas a produção de um efeito de real.<br />A leitura da poesia de Cacaso e de boa parte da dita poesia marginal, levando-se em consideração a opção pela apresentação de uma produção em fragmentos, exige, acredito, algo além do que a interpretação de fatos do poema como simples fotos do real, por meio da anotação, ou dos poemas como planos ideais de um suposto engajamento para com a realidade. Dizer apenas isso seria ainda muito pouco. É claro que esses poemas acabam funcionando como um microrganismo de uma macro-realidade, e também, curiosamente, como um macro-organismo de uma realidade que em si já se configura como fragmentada. Mas me parece fundamental, e até óbvio, perceber essa apresentação da realidade como a construção de uma outra. Que imagem é essa que ela evoca?<br />Lembremos da etimologia da palavra imagem, que pode ter o sentido de reproduzir fielmente algo, copiar, bem como simular, parodiar. Assim, poderíamos perceber que a presença daquilo que chamamos de “real” é difusa, mesmo em se tratando de uma escrita que tende a valorizar uma aproximação indelével com o cotidiano, como é o caso da poesia marginal. Logo, a crença de que o poema marginal funciona apenas como um registro do real dissimula um olhar perspicaz que não esquece que por trás da máscara do poeta, há máscaras e mais máscaras, e que por trás desse (des)pretensioso espelho, há espelhos e mais espelhos. Nesse sentido, o gesto aparentemente inocente de “rabiscar” a realidade no papel, comum na poesia dos anos 60 e 70, não deixaria de ser um gesto de violência, impossível tocar essa realidade sem seduzi-la e transformá-la.<br />Assim, em Cacaso, ao mesmo tempo, há uma tentativa de estreitar os laços entre a produção poética e o dia-a-dia, bem como instaurar uma prática que, sem esquecer dessa aproximação, lança um quesito fundamental para a conquista de uma produção poética séria, que pode, é claro, ser “malandra”, mas que sabe também que essa brejeirice, paradoxalmente, deve ser coisa séria, em se tratando de poesia.<br />Por mais que o poema seja rabiscado nos botecos da vida, entre um gole de cerveja e um trago no cigarro, Cacaso não abre mão do rigor. É o que pode ser observado no artigo “Tudo da minha terra” (1978), em que o escritor, ao comentar a poesia de Chacal, não esquece de “alfinetar” a vertente banal da poesia marginal: «Esta informalidade que hoje reina em setores importantes de nossa ideologia de resistência, em nossa multiforme contracultura, facilita a difusão e a aceitação da crença de que uma vez que fazer arte e viver já não se distinguem, então a possibilidade de criar já não supõe maiores capacitações, e todo mundo indistintamente é promovido a artista, o que é o mesmo que extinguir a espécie» .<br /><br /><em>Caio Ricardo Bona Moreira,<br />Prof. de Literatura da FAFIUV</em></div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-16209703262816855362010-04-06T12:22:00.000-07:002010-04-06T12:43:58.941-07:00Nicolas Behr, o marginal sobrevivente: urtiga! n°11<div align="justify"><span style="color:#ffffff;">.</span></div><div align="justify"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIxD8K_V2o9rrt447h7DcZv7DtRtx7-j5w-oc5wsP9sPP5jIWjTJBiI-Hy9XNKxdFSs30jIrbS1Gj3diDSSRmD-07CbJa4j_nPBgflhADXXwatxRJkhsN0a9Qa_3hjbPu9V6-Ya6wbgaM/s1600/fotoctracapapoesilia3.gif"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 184px; DISPLAY: block; HEIGHT: 225px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5457109127116428834" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIxD8K_V2o9rrt447h7DcZv7DtRtx7-j5w-oc5wsP9sPP5jIWjTJBiI-Hy9XNKxdFSs30jIrbS1Gj3diDSSRmD-07CbJa4j_nPBgflhADXXwatxRJkhsN0a9Qa_3hjbPu9V6-Ya6wbgaM/s320/fotoctracapapoesilia3.gif" /></a><br /><br /><div align="justify">Paulo Leminski, no desconhecido ensaio “Ler uma cidade: o alfabeto das ruínas”, publicado na década de 80, afirmou que de todos os edifícios, só um o interessava, a ruína. Para o poeta, era a ruína, resto de um sonho realizado, que dava sentido à cidade. Leminski lembra da atitude dos beatos seguidores de São Francisco de Assis que optaram por construir uma igreja que não passasse da primeira etapa. Começariam a construí-la e abandonariam a obra, construindo assim apenas uma ruína, com a pretensão de deixar um monumento gritante a todas as vaidades que juraram abandonar. Foi em Brasília que Leminski teve essa intuição. Ciceroneado pelo poeta Nicolas Behr, que lhe mostrou a arquitetura de Niemeyer, o curitibano se impressionou com o primeiro andar de um edifício interrompido, um começo de prédio com a ferrugem interna aparecendo, saindo de dentro do cimento armado, “como as tripas de um aborto ou a primeira quadra de um soneto inacabado”. Diz Leminski: “Behr, que ama Brasília até a insensatez, me tirou do pasmo, explicando que realmente era um prédio interrompido, que assim foi deixado para dar um toque humano àquela paisagem sublunar de ficção científica”.<br />A Brasília de Behr não é apenas o cartão postal de um Brasil moderno, cuja arquitetura tem em sua base os pilares/cariátides de Le Corbusier, Lúcio Costa e Niemeyer. A Brasília de Behr é também ambígua, complexa, e até mesmo o sintoma de uma ruína: “Como Brasília poderia dar certo com o Brasil em volta?”, pergunta o poeta.<br />Para Luiz Ruffato, “o brasiliense (de adoção) Nicolas Behr, que já foi um dia um poeta marginal - tão marginal que acabou preso pela Polícia Federal em plena ditadura militar, por escrever poemas -, virou cult, e agora parece ter sido adotado oficialmente pela inteligência, com tudo de bom e ruim que isso implica”. Já para Francisco Kaq, Behr foi, de todos os poetas marginais, o mais efetivamente oswaldiano, ao explorar uma poesia anti-retórica, coloquial e sintética. Lembremos que o humor é um dos traços principais de Oswald de Andrade. Em Behr, esse humor parece também povoar a leitura crítica que ele desenvolve da cidade: “blocos, eixos / quadras / senhores, esta cidade / é uma aula de geometria”. Vale a pena ler Brasília assim, como um alfabeto das ruínas de sua utopia. Behr, poeta marginal sobrevivente, se caracterizou como um dos mais curiosos moradores da Capital Federal dos fracassos. Agora, além fazer poesia, é também cultivador de plantas. O viveiro que administra é responsável pelo seu sustento e a literatura que produz é também responsável pelo nosso. O jornal urtiga! conversou com o poeta de Chá com Porrada e Poesília. a entrevista pode ser conferida abaixo. </div><div align="justify"><span style="color:#ffffff;">.</span></div><div align="justify"><span style="color:#ffffff;">.</span><br /></div><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 207px; DISPLAY: block; HEIGHT: 198px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5457109355697111218" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEimVZBA33Rwc2FFIOOjU_mBszLLsCa8w8d9CvM2O9t8Ue_6ydsqu3sQuF-IglHjG5v9MZw_8Cu6OuN2e7SoTcXd8fkB97O1q5n__FwfRBrSDHHp-pSl7FXPJ813qdlmzhAEICwHBmYMaL0/s320/desenho1.gif" /><br /></div><div align="justify">Obras publicadas:<br /><br />Livros Mimeografados<br />Iogurte com Farinha; Grande Circular; Caroço de Goiaba;<br />Chá com Porrada; Bagaço; Com a Boca na Botija; Parto do Dia; Elevador de serviço; PoeSia Nisso;Entre Quadras; Brasiléia Desvairada; Saída de Emergência; Kruh; l2 Noves Fora W3 ; Porque Costruí Braxília; Beijo de Hiena; Pelas Lanchonetes dos Casais Felizes; Segredo Secreto.<br /><br />Impressos em off-set<br />Poesília; Menino Diamantino,<br />Braxília; Eu Engoli Brasília; Peregrino do Estranho.<br /><br /><div align="justify"><br /><span style="font-size:130%;"><strong>POEMAS DE NICOLAS BEHR</strong></span><br /><br /><strong>"A superquadra nada mais é<br />do que a solidão dividida em blocos"<br /><br /><br />"brasília nasceu de um gesto primário.<br />dois eixos se cruzando. ou seja, o próprio<br />sinal da cruz. como quem pede benção<br />ou perdão"<br /><br /><br />"eu sei que errei<br />mas prometo<br />nunca mais<br />usar a palavra certa"<br /><br /><br />"Quem teve a mão decepada<br />levante o dedo"<br /><br /><br />"desço aos infernos<br />pelas escadas rolantes<br />da rodoviária de Brasília<br />meu corpo boiando<br />no óleo que ferve<br />um pedaço do teu coração<br />num pastel de carne"<br /><br /><br />"no princípio era a lama<br />a lama virou cama<br />e a cama virou câmara<br />onde eles legislam<br />deitam e rolam<br />brasília é o fracasso<br />mais bem planejado<br />de todos os tempos"<br /></strong><br /></div><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg7-mkrnCbnUspchWoUoUSfmeUGLYyEtiicbT4SGs-bXgjdPi6hYG1bBFqauGq-xA_PNeDq9CCGSKnzY9QnbfTEVqSdq2sr_lIqPkRIoH4UgF6aveiEfjBHs-9iPmlK0TXNXsZvIX7QAgs/s1600/NicolasBehr11.jpg"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 213px; DISPLAY: block; HEIGHT: 320px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5457107861653229378" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg7-mkrnCbnUspchWoUoUSfmeUGLYyEtiicbT4SGs-bXgjdPi6hYG1bBFqauGq-xA_PNeDq9CCGSKnzY9QnbfTEVqSdq2sr_lIqPkRIoH4UgF6aveiEfjBHs-9iPmlK0TXNXsZvIX7QAgs/s320/NicolasBehr11.jpg" /></a><br /><div align="justify"><strong>ENTREVISTA COM O POETA NICOLAS BEHR</strong><br /><br /></div><div align="justify"><strong>Nicolas, que é a poesia para você?<br /></strong>Poesia é tudo isso que você está sentindo agora.<br /><br /><strong>É sempre um problema compartimentar tendências, enquadrando poetas em movimentos, como quem guarda um livro em uma gaveta. Mas imaginemos que existiu, ou ainda existe, uma poesia marginal, enquanto movimento. Para você, o que significou ter participado da “geração mimeógrafo”? </strong><br />A chamada "Poesia Marginal" é um movimento dos anos 70 e lá deve ficar. Mas talvez a poesia tenha sempre sido e sempre será "marginal" porque provoca, instiga, cutuca. Pra mim foi um privilégio muito grande participar da "geração mimeógrafo" ( prefiro este nome à poesia marginal ) e, olha, eu era bom naquilo. Escrevia, imprimia e vendia. Uma relação orgânica com o livro, zero de distância entre o poeta e o público. Poesia de jovem pra jovem. Ruptura.<br /><br /><strong>Ser um poeta marginal é uma condição ou uma opção?</strong><br />Prefiro que me chamem só de "poeta", já tá bom e pesa bastante. Na verdade todos os poetas tem a sua fase marginal. Bandeira, Drummond e Cabral financiaram seus primeiros livros do próprio bolso. Todo poeta tem a sua fase heróica, digamos. Eu tento estender a minha até onde posso. Participo de saraus, vendo meus livros em eventos literários, não mais de mão-em-mão nos bares, como fazia nos anos 70.<br /><br /><strong>O espontaneísmo parece ter sido o grande triunfo da poesia marginal. O gesto entendido como mais importante que o próprio poema. Mas isso não vale para todos os poetas. Até que ponto podemos chamar de marginal uma produção mais “requintada”, que tinha pretensões literárias, como a de Ana Cristina Cesar, Waly Salomão e Chico Alvim?</strong><br />Convencionou-se chamar de "poesia marginal " a poesia dos anos 70, mas nem todos escreviam do mesmo jeito, nem todos vendiam livros de mão em mão. Ana Cristina Cesar e Chico Alvim são dois exemplos, de refinamento, sim. Mas mesmo eles tem um quê de espontaneidade, mas bem mais trabalhada. Claro, naquele vale- tudo muita coisa foi pro lixo e muita coisa se salvou. Talvez não se tenha publicado tanta poesia, em papel impresso, como naquela época. E do meio do lixo é que saiu um Leminski, um Cacaso, um Chacal. A qualidade saiu da quantidade. Hoje talvez se publique mais, mas em tela ( blogs) e não mais tanto em papel.<br /><br /><strong>Hoje, a poesia marginal virou “cult”, tema até de teses acadêmicas. Você acredita que a “institucionalização” dessa poesia dinamitou a própria intenção do movimento?<br /></strong>A tradição é feita de mini-rupturas, que vão se juntando, se juntando, até formar novas tradições. Eu já fui objeto de 3 dissertações de mestrado. A chamada "poesia marginal " bagunçou o coreto literário nos anos 70. Tirou o terno e a gravata da poesia, informalizou. Escancarou. Riu de si mesma. Acho que a poesia marginal representou um grande avanço, na democratização da poesia, novos públicos, novos leitores, novos meios. Experimental.<br /><br /><strong>Leminski, em um ensaio da década de 80, comenta que quando visitou Brasília, foi ciceroneado por Nicolas Behr. Você teria apresentado a ele as belezas arquitetônicas de Niemeyer. Mas o que chamou a atenção de Leminski foi um prédio em ruínas, o que o levou a desejar ser um “anarquiteto de desengenharias”. Você lembra desse encontro? E mais, ser poeta em Brasília não significa ser uma espécie de “anarquiteto de desengenharias”?</strong><br />Lembro-me muito bem desse encontro. Grande Leminski, Grande influência, da qual muito me orgulho. Ser poeta em Brasília é ir contra o poder, contra a burocracia, contra a corrupção. Por isso criei BraXília, com "x" mesmo. Uma cidade não-capital, não-poder.<br /><br /><strong>A sua relação com tua cidade parece ser de amor e ódio, como nos namorados. Continua achando que Brasília é o fracasso mais bem planejado de todos os tempos?</strong><br />Brasília foi uma bela tentativa. A generosidade, e, por outro lado, uma certa ingenuidade, dos seus criadores foi imensa. Queriam construir uma cidade socialista num país capitalista. E deu no que deu: Brasília espelho do Brasil. Minha relação com Brasília é difícil, e mantenho isso, esse conflito. Daí nasce minha poesia. No dia em que eu fizer as pazes com Brasília minha poesia acaba. Sim, é um amor difícil, um amor irascível. Mas um amor muito forte, por outro lado. Brasília é a minha obsessão poética. Brasília é uma cidade que me traumatiza. Para o bem.<br /><br /><strong>Você acredita que existe espaço ainda para um livro de poesia numa cueca recheada de dinheiro? Que significa ainda fazer poesia no mundo de hoje?</strong><br />Poesia é resistência. E enquanto o homem viver haverá poesia, pois o homem será sempre emoção, sentimento. Se o homem for fazer uma base na lua quem for há de escrever poemas, um dia. Não tem como escapar. </div></div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-38041720098157267432010-04-06T12:21:00.000-07:002010-04-06T12:22:47.118-07:00Apenas um sonho, por Rovane Gil - urtiga n°11Em apenas alguns versos,<br />Uma curta poesia.<br />De uma longa caminhada<br />Só restou a ironia.<br /><br />Vivendo a vida vazia<br />Percorrendo uma jornada<br />De uma simples alegria<br />Continua seguindo a estrada<br /><br />Sozinha? Que nada,<br />Um cão de companhia<br />Uma pessoa ali parada,<br />Procurando o seu guia.<br /><br />Uma charrete ali havia...<br />Parecia estar quebrada<br />E nada alem da neve fria<br />Daquela temporada.<br /><br />Seguindo a emboscada<br />Uma serra descia<br />Adiante uma arvore largada<br />Que quase não se via<br /><br />E a noite caía.<br />Vinha em disparada.<br />Entrou. Dali não saía,<br />Era uma casa abandonada<br /><br />Um quarto e uma sacada<br />Só isso bastaria<br />Com a noite iluminada<br />Ali descansaria.<br /><br />Seguindo amanhecia<br />Mas era madrugada<br />Em sua rotina persistia<br />Sem ser despertada.<br /><br />Por um sonho, carregada<br />Mas apenas a agonia<br />Tinha sido levada<br />E o autor não sabia...<br /><br />Um sonho de qualquer dia.<br /><br /><em>Rovane Gil é acadêmico de Letras da FAFIUV</em>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-38273897023355519172010-04-06T12:19:00.000-07:002010-04-06T12:21:41.972-07:00Escrevo... poema de Ângela Semczeszm - urtiga n°11Escrevo... escrevo na vida, escrevo sobre a vida...<br />Com extrema diligência e soberana sabedoria<br />Por quê? Oh! Dúvidas que insistem em me rodear<br />O futuro uma incerteza, ou a certeza de que ele virá!<br />Transborda sobre mim a nostalgia,<br />como uma aflita tempestade inesperada<br />E em meio ao vento impiedoso e aos raios furiosos<br />só me resta esperar, esperar...<br />E os raios solares e as nuvens alvas sendo uma utopia,<br />que vem os meus sonhos acalentar<br />Sou humana, carrego os pecados da carne,<br />mas considero como condição de sobrevivência<br />Mas em meu interior sei que sou pura ingênua,<br />como uma criança, singela, trêmula...<br />Ah! Eu quero viver muito e poder saciar meus sonhos...<br />Como um algodão doce que derrete na boca<br />e faz me saborear o doce desejado<br />Em meio à tempestade,<br />aos pecados e as virtudes eclipse solar...<br />E o ruído de pingos de chuva, como um cochichar,<br />algo que queira dizer, mas é indecifrável<br />O cansaço me domina, e num olhar pasmo,<br />delgado penso que é cessada a tempestade<br />No entanto, antes da lua se recolher,<br />só me resta uma dúvida impertinente...<br />Eu verei o sol nascer?<br /><br /><em>Ângela Semczeszm é acadêmica de Letras da FAFIUV</em>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-7960341828020056162010-03-13T08:24:00.002-08:002010-03-13T08:33:27.691-08:00Jornal urtiga! n° 10 - março 2010<strong><span style="color:#ffffff;">.</span></strong><br /><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhfAzPWcWiCyJmjvJ0JfS3CBs8fNcXc_96QcSoYveJl8Hc0cz2c1drLmW747xY4KMum5S45TiKR_HG2D4N5I9g-WsIIrzqUFlfUfZZFSE22jcCjUaV624AYR8fsYChs5RCN8Z7nxp0kRvU/s1600-h/urtiga10.jpg"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 283px; DISPLAY: block; HEIGHT: 377px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5448156245298566850" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhfAzPWcWiCyJmjvJ0JfS3CBs8fNcXc_96QcSoYveJl8Hc0cz2c1drLmW747xY4KMum5S45TiKR_HG2D4N5I9g-WsIIrzqUFlfUfZZFSE22jcCjUaV624AYR8fsYChs5RCN8Z7nxp0kRvU/s320/urtiga10.jpg" /></a><br /><div><div><span style="font-size:130%;"><strong>Colaboradores desta edição:</strong><br /><br />Karine Bueno da Costa<br />Katiúscia Silvestri<br />Natália Nunes<br />Simone Luiza Kovalczuk</span></div></div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-62770404261620883752010-03-13T08:24:00.001-08:002010-03-13T08:38:24.176-08:00"Entoar-te-ei hinos na harpa de dez cordas" - urtiga! 10<div align="justify">Um aluno recebe nota 10 como atribuição numérica de seu bom desempenho em uma avaliação. A gíria fala de uma pessoa «nota 10". O número 10 já protagonizou o slogan de uma marca de cerveja: «Kaiser: a cerveja nota 10". Zico usava a camisa 10. Maradona, Pelé, Raí, Roberto Dinamite também. 10 são os Mandamentos. Em 1913, Lênin escreveu o «Decálogo», que apresentava ações táticas para a tomada de poder na Rússia revolucionária. Em 1988, o diretor polonês Krzysztof Kieslowski (1941-1996) realizou a minissérie de televisão «O Decálogo», em dez episódios. Em 10 do 10 de 1910, foi inaugurada a Usina Hidrelétrica de Itatinga - SP (e daí?). No mesmo dia, António Cabral, antigo Ministro da Marinha e deputado do Partido Progressista português foi assaltado em Lisboa. Em 10 do 10 de 1910, um homem triste morreu, uma mulher amou e outra esqueceu. 10 é o número da perfeição das obras e da plenitude dos santos, o que é simbolizado por aquelas dez cortinas que, por ordem do Senhor (tal como aparece no Êxodus), foram feitas no tabernáculo do testemunho. D. Sancha, filha de D. Afonso Henriques, rei português do século XII, morreu com apenas 10 anos. </div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-25018463009275346632010-03-13T08:22:00.000-08:002010-03-13T08:24:04.110-08:00Yes, nós temos poetas! - urtiga! 10<div align="justify">Leon Tolstói dizia: «Cantes a tua aldeia e serás universal». No entanto, às vezes, a comunidade de leitores pensa que a poesia é sempre aquilo que não está aqui. Algo que é do lado de lá, de um passado distante ou de um espaço remoto. E o poeta-profeta, à maneira de Jesus de Nazaré, aproveitaria essa ausência para afirmar: «Meu reino não é deste mundo». Mas a poesia também é deste mundo. Yes, nós temos poetas! Em União da Vitória e Porto União também. Olhe com calma e verá. Para encontrá-los, é preciso muita concentração e muito siso, muita seriedade e pouco riso, como diria o poeta Vinícius de Moraes, em Para viver um grande amor. Some-se a essa concentração o exercício de desaprender as verdades estabelecidas, buscando na poesia um reencontro com a in-fans (infância) da linguagem, como diria Giorgio Agamben.<br />Peguemos no rabo de uma andorinha, ou de um cometa, e voemos até Cuiabá para ouvir o menino Manoel cantar: «Desaprender oito horas por dia ensina os princípios». Poesia pode ser olhar mais longe para aquilo que está mais perto.<br />Há em nossas cidades um grupo enorme de pessoas que se dedicaram e outras que continuam se dedicando à nobre tarefa de transformar o carbono em diamante, decifrar o código das águas, ou seja, fazer poesia. A lista é grande. Poderíamos apontar alguns, já pedindo desculpas para aqueles cujo nome não recordamos: Yvonnich Furlani, Ghassoub Domit, Cláudio Dutra, Helena Klotz, Yeda Ramires, Arlete Bordin, Ulisses Teixeira, Teresinha Moreira, Maria Catarina Heiss, Irene Rucinski, Manoel Claro Neto, etc. Se esses poetas são reconhecidos pela comunidade, ah!, essa é uma outra história. Basta dizer que o poeta escreve porque precisa e ponto final. Não escreve para ganhar dinheiro nem para ganhar uma coroa de louros, tal como os poetas da Antiguidade. Se for para ganhar dinheiro, melhor abrir uma frutolândia. Leminski costumava dizer que o poeta não é uma excrescência ornamental, um ser de luxo, mas uma necessidade orgânica da sociedade, já que ele diz o que a sociedade precisa ouvir. Ela precisa de poetas, da ruptura que eles representam, para poder respirar.<br />Uns vêm, outros vão. Mas todos, de uma maneira ou de outra, criam laços com a comunidade, imprimindo seu modo de olhar o mundo, seu jeito de cantar a vida. Yvonnich Furlani, por exemplo, não nasceu aqui, mas aqui se fez poeta: «Eu sou como aquele chorão / do outro lado do rio / finquei raízes como ele / eu fico aqui / à beira do Iguaçu!». O poema «Eu fico aqui» poderia ser lido à luz da conhecida expressão «Bebi água do Iguaçu!». Se a cidade pudesse falar, provavelmente responderia: «E quem bebe de minha água jamais esquecerá». Não se trata apenas de cantar a cidade. Há poetas que não a cantam, mas encantam, e nem por isso deixam de ser bons poetas. É o caso da poesia transcendental de Ghassoub Domit, ao cantar a ressurreição da mitologia; da poesia líquida de Cláudio Dutra; da ornamental de Manoel Claro Neto; ou da lírica de Helena Klotz e Yeda Ramires.<br />O setor de Literatura Brasileira do Colegiado de Letras da FAFIUV aceitou o desafio de desenvolver o projeto «Memórias Poéticas do Vale do Iguaçu», sabendo da importância dessas manifestações literárias locais. Na década de 70, o curso lançou a I Antologia Poética do Vale do Iguaçu, coordenada pelos professores Francisco Filipak, Nelson Sicuro e Fahena Porto Horbatiuk. O trabalho não apenas apresentou a biografia e parte da produção desses poetas, mas também forneceu críticas que auxiliaram a compreensão das obras por eles produzidas.<br />O presente projeto, além de preparar a II Antologia, intenta desenvolver oficinas poéticas nas escolas locais, bem como produzir um vídeo-documentário sobre a poesia regional. Outro objetivo é resgatar o trabalho de Helena Kolody, poeta natural de Cruz Machado, que se projetou como uma das grandes artífices do haicai no Brasil. O trabalho conta com a orientação dos professores Bernardete Ryba, Caio Ricardo Bona Moreira e Josoel Kovalski, bem como com a pesquisa das alunas Jaqueline Naiser, Anne Schulz, Simone Kovalczuk, Juliana Santana, Fabiana Meneguel (graduação) e Karine Bueno Costa (pós-graduação). </div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-62715892356562410642010-03-13T08:20:00.000-08:002010-03-13T08:32:38.502-08:00A figura da mulher nas obras de Álvares de Azevedo - urtiga! 10<span style="color:#ffffff;">.</span><br /><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgdIKkAfDXD4JjSl6e6FYjU3Hwah1tL6UbAtX1lD2sPVQ-BSy2e1koXCsBuivgJhun1aK7sdwH1rh1B3ME7FL1rb0vTa4o_5RrKo-VG_ixIjRecHLGMasmVmcCWuI9VrkcFECo_4buUqFk/s1600-h/alvares-de-azevedo1.jpg"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 242px; DISPLAY: block; HEIGHT: 388px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5448154413664950418" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgdIKkAfDXD4JjSl6e6FYjU3Hwah1tL6UbAtX1lD2sPVQ-BSy2e1koXCsBuivgJhun1aK7sdwH1rh1B3ME7FL1rb0vTa4o_5RrKo-VG_ixIjRecHLGMasmVmcCWuI9VrkcFECo_4buUqFk/s320/alvares-de-azevedo1.jpg" /></a><br /><div align="justify"></div><br /><div align="justify">Álvares de Azevedo é popularmente conhecido como o poeta que cantou a morte. Muitos estudos, desse modo, são realizados perante tal perspectiva. Um ponto marcante e, todavia pouco explanado, é a figura feminina que permeia, constantemente, os seus versos.<br />Infelizmente, não se sabe muito a respeito da vida sentimental do poeta. Segundo Junior (1971), esse assunto é um capítulo vago, confuso, nebuloso. Muito se diz a respeito, mas não há uma afirmação que se sobressaia das demais. As únicas provas da vida amorosa se encontram na sua vasta obra e nas poucas cartas direcionadas à mãe e aos parentes mais próximos. O intrigante é que ambas se contradizem.<br />Muitos biógrafos alegam que Álvares morreu tão virgem quanto nasceu. O que torna ainda mais surpreendente o modo pelo qual ele descreve a mulher em suas poesias: «Em frente do meu leito, em negro quadro / a minha amante dorme. É uma estampa / de bela adormecida. A rósea face / parece em visos de um amor lascivo / de fogos vagabundos acender-se... / e com a nívea mão recata o seio» (Idéias Íntimas- VII). Assim, até que ponto a vida particular do poeta influenciou a sua produção literária?<br />Para José Veríssimo, esse amor «é mais um desejo de amar, a aspiração por uma mulher idealmente amada, que uma paixão verdadeira e pessoal». No entanto, mesmo que uma parte considerável de sua obra designe as mulheres por anjo, virgem, mãe, irmã, podemos também encontrar nomes de mulheres.<br />No livro Lira dos Vinte Anos nos deparamos, em duas ocasiões, com o nome Ilná, a quem o poeta refere-se com as expressões: «ó minha noiva, minha doce virgem». Seria Ilná uma mulher real e presente na vida de Álvares ou mais uma idealização? Ilná é citada na poesia Anima mea (Ex.: Vem, Ilná: dá-me um beijo - adormeçamos...) e em Lembrança dos quinze anos. O título da segunda poesia é sugestivo e pode nos levar a conjecturar que essa moça esteve presente na adolescência do poeta e, seria plausível, que a mesma estivesse inserida, de algum modo, em sua rotina.<br />Se Ilná povoou, supostamente, os sonhos de adolescente, uma outra jovem, Teresa, lhe fez vibrar o coração no final de sua breve existência. Inclusive seu nome é título de uma poesia.<br />Junior (1971), quanto a isso, alega que «Teresa é, assim, a mais constante das musas do poeta. Em suas poesias aparecem outros nomes femininos, - Zoé, Inês, Haidéa, Anália, Armida, Madalena, Lélia, Consuelo – mas todas elas parecem meras realizações literárias». Álvares, em cartas ao primo Luis Antonio da Silva Nunes, confessa, primeiramente aos 17 e depois aos 18 anos, que não encontrara um novo amor (nesse ponto, podemos supor que Ilná, realmente, fora o primeiro amor) em São Paulo e que acreditava-se predestinado a morrer de amor sem que ninguém o amasse. Falando de Álvares de Azevedo, Manuel Bandeira refere-se ao «seu erotismo travado pela timidez», ao passo que Mário de Andrade defende que o poeta, por mais ousado que fosse em suas páginas literárias, tinha verdadeira fobia de amor sexual.<br />Mário de Andrade, em outra passagem, expõe a seguinte afirmação: «Álvares de Azevedo sofreu como nenhum, apavoradamente, o prestígio romântico da mulher. Pra ele a mulher é uma criação absolutamente sublime, divina e... inconsútil. O amor sexual lhe repugnava, e pelas obras que deixou é difícil dizer que tivesse experiência dele». Talvez seja por isso que o poeta, mesmo descrevendo intimamente a mulher, sempre a eleva ao título de virgem. Quando se estuda a vida do referido autor, é impossível não falar sobre a presença constante da mãe. Junior em Poesia e Vida de Álvares de Azevedo salienta que D. Maria Luisa sempre esteve presente na vida de Álvares, apaziguando suas dores. A pior delas é datada de quando, em férias da Faculdade, num passeio a cavalo, o poeta sofre um acidente e quarenta dias depois vem a falecer, aos 21 anos incompletos. O amor que nutria pela mãe ficou evidenciado em inúmeras poesias. Algumas foram redigidas unicamente com o intuito de homenageá-la. Para ilustrar a afirmação anterior, temos em À minha Mãe, mais precisamente na quinta estrofe: «Criatura de Deus, ó mãe saudosa/ No silêncio da noite e no retiro/ A ti voa minh'alma esperançosa/E do pálido peito o meu suspiro».<br />Para finalizar, recorro a Oliveira, quando a mesma afirma: «Todas as suas obras (de Álvares) foram editadas sob os cuidados de sua mãe, que sobreviveu mais 44 anos após sua morte. Dedicou-se, até os 84 anos, à perpetuação da memória e da obra de seu filho, e o primeiro livro que fez publicar foi Lira dos Vinte Anos». É verídico afirmar, como ressalta o presente estudo, que o referido poeta amou e muito, mas devido a ausência de uma mulher “real” que o correspondesse, ele canalizou todo o seu amor à poesia e à sua mãe. De uma forma brilhante, por sinal.<br /><br /><em>Simone Luiza Kovalczuk<br />Acadêmica de Letras da FAFIUV; Integrante do projeto Memórias Poéticas do Vale do Iguaçu.</em></div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-27595360989546690182010-03-13T08:10:00.000-08:002010-03-13T08:31:57.975-08:00Helena Kolody: Olhos de Esfinge - urtiga! 10<span style="color:#ffffff;">.<br /></span><div><div><div><div align="justify"><em>Helena Kolody é uma das maiores poetas do Paraná, e é o ponto de partida para os estudos do projeto Memórias Poéticas do Vale do Iguaçu, patrocinado pela Fundação Araucária, e desenvolvido pelo setor de Literatura Brasileira do curso de Letras da FAFIUV. O projeto pretende fazer um resgate da poesia produzida na região. Algumas atividades estão previstas, como a elaboração da II Antologia Poética do Vale do Iguaçu, a produção de um documentário com depoimentos de poetas da região, bem como a aplicação de oficinas para alunos do Ensino Fundamental de escolas de União da Vitória e Cruz Machado.</em> </div><div align="justify"><span style="color:#ffffff;">.</span><br /></div><br /><div align="justify"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 240px; DISPLAY: block; HEIGHT: 320px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5448153565091741874" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhCuZyxpesJOI-jxCu8vivE29kHFpM9rCy2hBATpUClCQefU-NUf-wMVNd9hZRBuif6LRlXJJhLwPWmQNfhjPEjFeEVN9oFfvqVGRBQSZ9jYiTqRPC6_LzkUixSQCWkMQ4bZKhaK4Xv0xo/s320/foto-helena-1.jpg" /><br />«A frase/poema sai do cotidiano, passeia pela experiência da sensibilidade e termina por acertar no ponto limítrofe entre o pensar e o sentir». É o que Alice Ruiz diz em artigo para Galiere, em 1987, sobre a obra de Helena Kolody. Como se poeta e poesia se tornassem uma mistura homogênea no ato da escrita, «num aperfeiçoamento em que espírito e técnica se fundem para deixar em nós, definitivamente, o perfume da mais autêntica poesia». E é assim que se pode definir Kolody, não apenas uma poeta, mas a poesia em si, como se ambas fossem uma coisa única.<br />Desde pequena Kolody adorava ler e escrever. Seus primeiros poemas foram escritos com apenas 13 anos de idade. Nunca se esqueceu de suas origens, foi a primeira brasileira de sua família ucraniana: «Olha pela janela azul do meu olhar / sereno e transparente, onde se esconde calma / a misteriosa esfinge eslava que é minh'alma. / Se olhares bem, verás, por certo, desdobrar-se/ Pela minh'alma adentro a estepe soberana». Adora a cultura de suas raízes: «Na memória do sangue, / há bosques de bétulas, / estepes de urzes floridas / canções eslavas». Também sua terra natal, Cruz Machado, e as cidades onde passou a infância, Três Barras e Rio Negro: «Vim de meu berço selvagem, / lar singelo à beira d'água, / no sertão paranaense». E principalmente Curitiba, cidade onde cresceu e evoluiu intelectualmente: «Por fim ancorei para sempre / em teu coração planaltino, / Curitiba, meu amor!».<br />Helena foi professora de biologia. Suas aulas eram recheadas com poesias. No final das aulas lia um de seus poemas para a classe, todos ficavam encantados procurando decifrar o «enigma/professora de olhos azuis», que sempre foi muito misteriosa. A escritora viveu uma espécie de afastamento, não isolado, mas de observações deste demasiado mundo, e dessa observação um pouco narcisista, com olhos esfíngicos, dentro de um eu que se transfere ao leitor. Como diz Paulo Venturelli: «O que há de pessoal, na verdade, adquire uma coloração de inter-pessoal para permitir uma identificação mais plena com o leitor». Kolody criou poemas repletos de sonhos, de uma dimensão maior que a realidade, um sono acordado, ou como ela escreveu: «Do longo sono secreto/ na entranha da terra,/ o carbono que acorda diamante.”<br />O sono/sonho está presente em muitos de seus poemas: «Quando sonho, sou outra/ inauguro-me». Na verdade ela se inaugurava quando escrevia: «Vejo melhor/ quando sonho/ de olhos fechados», ou: «Na realidade eu sonho palavras». E apesar de querer ser só oniricamente, seus poemas a ligam com o mundo exterior. Venturelli nos diz que «ela precisa do leitor, já que pretende agir sobre ele por meio de magia. Então, cuidadosamente, deixa alguma porta entreaberta: afasta um eu excessivo e abre campo para a interferência do leitor». Seus primeiros escritos são mais líricos. Neles, pode-se constatar o amor impossível, amor que ela guardou só para si e para a poesia, pois não se casou e não teve filhos. Mas sabemos que um amor verdadeiro existiu: «(...) Eterno sonhador, teu vulto pensativo/ vive na timidez do meu amor esquivo». O amor para ela se tornou apenas sonho e literatura: «fomos duas arvores castas / não misturamos as raízes / Apenas enlaçamos / os ramos / e sonhamos juntos».<br />Outro traço marcante em sua poesia é a sua fé. Helena sempre foi muito católica. Um de seus poemas recebeu o imprimatur da igreja e se tornou oração: «Concede-me, Senhor, a graça de ser boa, / de ser o coração singelo que perdoa, / a solícita mão que espalha, sem medidas, / estrelas pela noite escura de outras vidas / e tira d'alma alheia o espinho que magoa». Conclui-se que Deus atendeu seu pedido, pois era adorada por todos. Leminski, sobre ela, relata: «Mãe querida, nada como ter uma fada na vida».<br />A maior realização literária se dá com os haicais e poemas curtos. Foi uma das primeiras brasileiras a se aventurar na arte oriental. Sua poesia mínima pode ser comparada a um vôo breve de águia, leve, veloz e impressionante: «Prisioneiro do nada / pássaro mutilado / que a distancia fascina». Foi Andrade Muricy quem a incentivou a investir nessa técnica, um conjunto de palavras que remete a uma enorme rede de imagens: «Escrevo por prazer. Às vezes, meus poemas afloram por inteiro. (...) São o que chamo de vivíparos. Estes são os melhores e geralmente estavam hibernando dentro de mim. Outros são ovíparos, é só um núcleo que amadurece».<br />Com a maturidade Helena, que era leitora de Proust e Fernando Pessoa, passou a adquirir mais técnica e a escrever de maneira mais filosófica, como no poema que dedicou para o poeta Paulo Leminski: «A casca espinhenta/ guarda a macia doçura da polpa». Sua obra representa uma vida de evolução intelectual. Por 23 anos fez parte da Academia Paranaense de Letras, sendo a segunda mulher a participar do grupo. Como em todo autor, podemos encontrar diálogos com outros escritores, como Cecília Meireles.<br />Sempre acompanhada de uma solidão única, refletindo sobre a morte, sobre questões metafísicas e trans-cendentais, Kolody acaba em suas últimas obras por apontar o valor da vida, defendendo o princípio de que a poesia pode transformá-la: «São palavras que decidem a sorte dos homens e o destino das nações». Então, deixa o pessimismo de lado e canta: «Se tens um elogio a proferir é tempo agora».<br />Quando perguntada sobre a morte, respondeu: «Não temo a morte porque creio no Eterno. O sonho continua sendo a minha matéria». Seu sonho se materializou em poesia, portanto ela se tornou ETERNA.<br /><br /><em><br />Karine Bueno da Costa<br />Graduada em Letras pela FAFIUV.<br />Cursando especialização em Língua Portuguesa e respectivas literaturas, na mesma Instituição. É integrante do projeto Memórias Poéticas do Vale do Iguaçu. </em><br /><br /><br /><span style="font-size:130%;">Poemas de Helena Kolody<br /><br /><br />Alquimia<br /><br />Nas mãos inspiradas<br />nascem antigas palavras<br />com novo matiz.<br /><br /></span></div><span style="font-size:130%;"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 151px; DISPLAY: block; HEIGHT: 231px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5448152836666465906" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjT_VOr9zj9PquTdAuus-N95DyWJdWB3Zl1teiOl0p9YHXXSUvXfNxC-nfclIyTIzK_W01lCIwwTmpvjf4RWE2opWw8vDEUGqoy1Su4_-HpaZwlZqqCcaiQMGWKzDk0BZBoS9SmFQpmE7Y/s320/bijin-scroll8-3.jpg" /><br />Desafio<br /><br />A vida bloqueada<br />instiga o teimoso viajante<br />a abrir nova estrada.<br /><br /><br />Prisão <img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 133px; DISPLAY: block; HEIGHT: 268px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5448153085089435810" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhLJ3yHW5a7eFb9nuAf-gJFdVRY5KfPvxtoy82qY3EbTWVfjr3c4MahMLdb915RSi_On9XLLLydbXXdurnNklktsYA12N5MbStJrxzo6RAibVWvHMkKny4We-vMnbUjfYo7_N1vLhZ0e7E/s320/hiroshige_d.jpg" /><br /><br />Puseste a gaiola<br />Suspensa de um ramo em flor<br />num dia de sol.<br /><br /><br />Noite<br /><br />Luar nos cabelos<br />Constelações na memória.<br />Orvalho no olhar.<br /><br /><br />Areia<br /><br />Da estátua de areia,<br />nada restará<br />depois da maré cheia.<br /><br /><br /><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 271px; DISPLAY: block; HEIGHT: 192px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5448152309489735874" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgbzy_M7xGmLxD2nhk9wY_9tJUbPY46Y3hN2SnU-_P7kGJio56u5bQosQpAAvKWhZJBpgWH5Y9ElqA9czUvW6TcJR8d13pkWGTERGb3JicZYAwXYTPfSPAj9ce9yQ-9KvekMNLfZCob9fc/s320/087.jpg" /><br />Indigência<br /><br />Mãos de vento<br />constroem na areia<br />a exígua morada nos dias,<br />sem mirantes para o mar.<br /></span><br /><br /><em>As ilustrações são representações do Ukiyo-e (“retratos do mundo flutuante”), conhecido também por estampa japonesa, um estilo de pintura desenvolvida no Japão ao longo do período Edo (1603-1867). Foi uma técnica amplamente difundida por meio de pinturas executadas com o auxílio de blocos de madeira usados para impressão entre os séculos XVIII e XIX (fim do período Edo). Geralmente representava temas teatrais.</em></div></div></div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-60353972520693319532010-03-13T08:05:00.000-08:002010-03-13T08:37:59.133-08:00Criação - Contos de minuto, por Katiúscia Silvestri - urtiga! 10<div align="justify"><span style="color:#ffffff;">.</span></div><div align="justify"><span style="color:#ffffff;">.</span></div><div align="justify"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgWMBroAdD06ISSKA6BipkUF4AMdgzgF1imPJJcS2oma7KVby1RDrJ7Vq6KWNVZVjtEInRW4YspVljmQYRS50_x38nKDvB6Imdj7P4Y1VlDxL0C9r2iZT0PXb0y3OBEbd4va9ndGtj4c0c/s1600-h/1.jpg"><img style="TEXT-ALIGN: center; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 295px; DISPLAY: block; HEIGHT: 398px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5448150740917082722" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgWMBroAdD06ISSKA6BipkUF4AMdgzgF1imPJJcS2oma7KVby1RDrJ7Vq6KWNVZVjtEInRW4YspVljmQYRS50_x38nKDvB6Imdj7P4Y1VlDxL0C9r2iZT0PXb0y3OBEbd4va9ndGtj4c0c/s320/1.jpg" /></a><br /><div align="justify"><em>Katiúscia Silvestri é natural de São Miguel do Oeste, mas vive em Porto União. Cursa Jornalismo na UNIUV (Centro Universitário de União da Vitória), escreve no blog Contos de minuto e participa da antologia 6 pra casar, a ser lançada.<br />A poesia-prosa de Katiúscia Silvestri, sem exagero, faz lembrar a escrita de Ana Cristina Cesar, no que ela tem de doce e ácida, elíptica e concentrada. «Meia-bruxa, meia-fera, risinho modernista arranhando na garganta, ou mesmo cara-pálida que desconhece o próprio cor-de-rosa», diria a poeta de «A teus pés». Chega de comentários. Vamos aos textos. Neles, nada importa que não seja o corpo, a palavra, os dentes e um filete de sangue escorrendo dos lábios depois do beijo e da mordida. Enfim, uma máquina de fabricar encantos e malícias, gostosuras e travessuras. </em><br /></div><br />..............................................................................................................<br /><br />Antes de nascer o dia, barulho de folhas.<br />Folhas secas de outono, folhas de caderno.<br />Entreabri os olhos e a vi sentada ao pé da cama, ainda nua,<br />como se acabasse de sair do banho.<br />Chovera durante toda a noite. Lá fora, água. No quarto, beijos.<br />Ela fechou a cortina e eu, os olhos.<br />Ela vestia a roupa tão rápido quanto eu minhas fantasias.<br />Nelas, como se escrevesse em nuvens,<br />escrevia em suas coxas,<br />tão macias quanto.<br />Um batom era a caneta. Vermelho, sempre.<br />E ao final, folhas e corpos riscados, fazia o desenho<br />de um A. "Com Amor", terminava.<br />"A", o começo do alfabeto e o fim da carta,<br />o fim da noite, o fim da chuva,<br />aqui dentro e lá fora. Ela abria a cortina,<br />eu não abria os olhos, e ela partia.<br />A cada segunda-feira, enquanto eu ouvia<br />o barulho das folhas, ela escrevia.<br /></div><div align="justify"></div><div align="justify"><br />Boca cor de céu, bochechas encaracoladas, olhos sabor pitanga e cabeleira rosada e de aparência saudável. Alta como o perfume dos lírios e com cheiro de três andares.<br />Ao andar, flutuava elegante como um caminhão em rodovia esburacada. Certamente era uma deusa. E só eu tive o privilégio de vê-la antes de ser reduzida a chiclete em sola de sapato.<br /></div><div align="justify"></div><div align="justify"><br />Preciso comprar uma bolsa<br />Pegar uma faca e rasgar tua cara no meio.<br />Depois, arrastá-la pelos cabelos e fazer o mesmo com ela. É isso que eu faria se tivesse uma faca quando te visse com ela.<br />Só não faço porque não tenho bolsa pra esconder a faca.<br /></div><div align="justify"></div><div align="justify"><br />A banheira transbordando de espuma.<br />Velas acesas e ela despida.<br />- Vem cá, meu bem!<br />E puxou o espelho para mais perto de si.<br /></div><div align="justify"></div><div align="justify"><em></em></div><div align="justify"><em>Imagem: Natália Nunes</em></div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-85081764626924273672009-12-09T13:12:00.000-08:002009-12-09T13:13:21.808-08:00urtiga! n°9 - Novembro 2009<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjoLXSQkcfTMl8UbzV87qZI6HWLEJhj1BQ1NQrm_i2NX38RM5E85Ssm2pCrqHB0LDgMUuP4Et1dduH7MHSrb-ntwkWAlTJEHU9mSVmYCdCk-9O1pRaTh88hjo_rsOarINNF27093PIxFPg/s1600-h/urtiga+9.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5413347322785718338" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 235px; CURSOR: hand; HEIGHT: 320px; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjoLXSQkcfTMl8UbzV87qZI6HWLEJhj1BQ1NQrm_i2NX38RM5E85Ssm2pCrqHB0LDgMUuP4Et1dduH7MHSrb-ntwkWAlTJEHU9mSVmYCdCk-9O1pRaTh88hjo_rsOarINNF27093PIxFPg/s320/urtiga+9.jpg" border="0" /></a><strong> Colaboradores desta edição:</strong><br /><strong></strong><br /><strong>Emili Albuquerque</strong><br /><strong>Larissa Ceres Lagos</strong><br /><strong>Lia karine Gregório</strong><br /><strong>Karine Bueno da Costa</strong>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-58568004440943299312009-12-09T13:11:00.001-08:002009-12-09T13:11:58.606-08:00A redação agradece aos urtigas de 2009, que alimentaram este jornal, por meio de suas colaborações:<br /><br />Isaak Nogueira, Lia Karine Gregório, Jucimara Garbos, Marcelo Bueno de Paula, Ana Cláudia Zan, Atílio Matozzo, Larisa Ceres Lagos, Manoel Ricardo de Lima, William Medeiros, Eduardo Recife, Eloy Tonon, Emili Albuquerque, Maria Celina Keito, Renata Telles, Sabrina Pedroli, Samon Noyama, Daniel Baez Brizueña, Karine Bueno da Costa, Adriana Bueno de Oliveira, Andréa Rocco Liziero, José Castello, Margarida Jak, Priscila Zastani, Sandra Regina Krulikoski, Alexandre Nodari, Ilton Cesar Martins, Elis de Paula, Leandro José Müller, Carpinejar, Josoel Kovalski, Ana Paula Such, Caio Ricardo Bona Moreira.Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-63817484166742911182009-12-09T13:10:00.000-08:002009-12-09T13:11:40.883-08:00Autor: pessoa ou fantasma? - urtiga! n° 9<div align="justify">Até que ponto podemos afirmar que a vida pessoal do escritor é verdadeira em um relato? Será que o que lembramos aconteceu da maneira que lembramos, ou da maneira como gostaríamos que tivesse acontecido? Não há como medir a veracidade. Mário Quintana diz em um de seus poemas: “A memória tem uma bela caixa de lápis de cor”, exatamente pelo fato que, ao lembrarmos, interferimos nessa realidade, modificamos, moldamos. Waly Salomão costumava dizer que a memória é uma ilha de edição. Até mesmo quando se propõe a escrever sobre seu mundo real, o autor nem sempre pode estar sendo “verdadeiro”. Maurice Blanchot desenvolve uma reflexão sobre o diário íntimo que poderia nos ajudar a pensar essa questão. Para ele, o extraordinário faz parte do ordinário. O que tomamos como diário íntimo, numa obra literária, pode ser uma armadilha. Escrevemos para nos lembrar de nós, no entanto, a vida que migra para a obra é um reflexo ilusório: “O diário está ligado à estranha convicção de que podemos nos observar e que devemos nos conhecer”. Advém dessa convicção a idéia que podemos conhecer o autor através da sua obra. Em certa medida, essa alternativa parece ser um problema, ou mesmo uma armadilha. O filósofo italiano Giorgio Agamben, em Profanações, lembra que “não podemos trazer à linguagem nossos desejos porque os imaginamos”. E a imaginação é artifício. Se o corpo dos desejos é uma imagem, o que é inconfessável no desejo é a imagem que dele fizemos: “Comunicar a alguém os próprios desejos sem as imagens é brutal. Comunicar-lhes as próprias imagens sem os desejos é fastidioso (assim como narrar os sonhos ou as viagens). Mas fácil, em ambos os casos. Comunicar os desejos e as imagens desejadas é tarefa mais difícil. Por isso a postergamos. Até o momento em que começamos a compreender que ficará para sempre não cumprida. E que o desejo inconfessado somos nós mesmos, para sempre prisioneiros na cripta”. Há um interessante artigo de Annita Costa Malufe, sobre a poeta Ana Cristina Cesar, que defende que o texto literário é sempre, enfaticamente, construção. Ou seja: “Ele não é a representação de uma realidade outra – seja ela do exterior, do mundo, das coisas, ou mesmo do interior daquele que o escreveu - mas constitui em si uma realidade. Não há modelo e cópia, não há a representação de um ideal, mas a apresentação de um real inédito, um universo próprio e autônomo do texto”.Na literatura, Mallarmé foi um dos precursores dessa perspectiva, chamando a atenção para o corpo da linguagem e não para a figura do “gênio”, do escritor. É o que acabou interessando a um teórico como Foucault, ao enfocar a escrita liberada da função de expressar o mundo e a realidade, e voltar-se para a linguagem como um universo autônomo. Malufe ainda observa que com isso, “são abertas as portas para uma nova compreensão da literatura, aquela que a enxerga como algo que subverte a linguagem, que quer dar-lhe uma nova função”. Que nova compreensão da literatura seria essa? Uma literatura que leva em consideração que o ato da leitura consiste basicamente em “puxar o significante”, como nos disse Ana Cristina Cesar, ou seja, ir fazendo associações das mais diversas e inesperadas a cada vez: “Ler é meio puxar fios, e não decifrar”.Poderíamos considerar também o autor como uma espécie de personagem. Segundo Roland Barthes, no texto “A morte do autor”, “o autor é uma personagem moderna, produzida sem dúvida por nossa sociedade na medida em que, ao sair da Idade Média, com o empirismo inglês, o racionalismo francês e a fé pessoal da Reforma, ela descobriu o prestígio do indivíduo ou, como se diz mais nobremente, da pessoa humana”.Sob esse ponto de vista, o autor ainda reina em manuais de história literária, como um ente, ao contrário de tendências que tentaram problematizá-lo, como Mallarmé, Valery, Blanchot, Foucault, o próprio Barthes, bem como a escrita automática surrealista. Poderíamos, então, observar que o autor moderno é diferente do autor tradicional: “o escriptor moderno nasce ao mesmo tempo que seu texto; não é, de forma alguma, dotado de um ser que precedesse ou que excedesse a sua escritura, não é em nada o sujeito de que o seu livro fosse o predicado”. Ainda seguindo os passos de Barthes, somos levados a crer que uma vez afastado o autor, a pretensão de “decifrar” um texto se torna totalmente inútil. Na escritura múltipla, aquela destituída da figura do autor, “tudo está para ser deslindado, mas nada para ser decifrado”. O que por si só já bastaria para desencadear uma nova concepção da literatura.Comentar a obra, nesse caso, só pode ser possível se partirmos do pressuposto de que a leitura é uma espécie muito especial de re-invenção da obra.</div><div align="justify"><br />Lia Karine Gregório</div><div align="justify">Graduada em Letras pela FAFIUV</div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-46164377185872886712009-12-09T13:08:00.000-08:002009-12-09T13:16:24.836-08:00Ana Cristina Cesar: uma doçura venenosa de tão funda - urtiga! n°9<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhehl7sDRT-bVTHDSZnJ4Wirf_rfO6pQg26toNIor9y3e2JAdq9wt8fZ7JGKrlu8RRWLNbZ6e5ioW2PIUiUBUzzBlWvI_x5MI8Oy9Oed6FRCui6Ku5KS1Ga2ORk6ApG7vj6qIlD2BAvORk/s1600-h/ana-cristina-cesar1.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5413348335217575378" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 320px; CURSOR: hand; HEIGHT: 313px; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhehl7sDRT-bVTHDSZnJ4Wirf_rfO6pQg26toNIor9y3e2JAdq9wt8fZ7JGKrlu8RRWLNbZ6e5ioW2PIUiUBUzzBlWvI_x5MI8Oy9Oed6FRCui6Ku5KS1Ga2ORk6ApG7vj6qIlD2BAvORk/s320/ana-cristina-cesar1.jpg" border="0" /></a><br /><div align="justify"><em>«É sempre mais difícilancorar um navio no espaço»<br />Ana Cristina Cesar</em></div><br /><div align="justify"><br />Ana C., como assinava, está entre os principais poetas representantes da literatura dita marginal, junto com Paulo Leminski, Cacaso, Francisco Alvim e Waly Salomão. Foi uma poeta que inovou, escrevendo de forma muito peculiar. Uma espécie de Frida Khalo. Assim como a pintora se auto-retratou em sua pintura, Ana se revelou em suas poesias, em seus poemas-prosa. Escreveu em primeira pessoa, conferindo a sua obra um caráter confessional. Em palavras poéticas, questionou-se: «Pergunto aqui se sou louca/ quem quer saberá dizer/ Pergunto mais, se sou sã/ E ainda mais, se sou eu/ Que uso o viés pra amar/ E finjo fingir que finjo/ Adorar o fingimento/ Fingindo que sou fingida/ Pergunto aqui meus senhores/ Quem é a loura donzela/ Que se chama Ana Cristina/ E que se diz ser alguém/ É um fenômeno mor/ ou é um lapso sutil?», e convicta defendeu: «Forma sem norma/ defesa cotidiana/ conteúdo tudo/ abranges uma Ana.» Enfim, Ana C. traduziu-se em poesia, transformou-se em arte. E quem finge que finge, adora dizer a verdade. Ana nasceu em 2 de janeiro de 1952, no Rio de Janeiro. Era de família culta e de classe média. Desde pequena, sentia uma forte atração pela literatura. Mesmo sem ser alfabetizada, com apenas quatro anos já recitava poemas para que os adultos escrevessem. Escrevia compulsivamente, “escrevo in loco, sem literatura”. Foi apaixonada por Drummond, Pessoa, Baudelaire, mas o que exerceu mais influência sobre a escritora carioca foi a literatura inglesa de Emily Dickinson, Sylvia Plath e Katherine Mansfield. Sua vida foi toda voltada para a arte. Estudou literatura, tradução e cinema, formou-se em Letras na PUC do Rio de Janeiro, fez mestrado em comunicação na UFRJ, e mestrado em tradução na Inglaterra na Universidade de Essex.Escreveu para jornais, revistas, foi jornalista, deu aulas e publicou de forma independente seus livros: Cenas de Abril, Correspondências Completas e Literatura não é documento. Mais tarde os dois primeiros reunidos, junto com Luvas de pelica no livro A teus pés, pela editora Ática. Postumamente, foram lançados: Inéditos e dispersos e Crítica e tradução.</div><br /><div align="justify"></div><br /><div align="justify">Na leitura de seus poemas vemos sua imagem. Ela embriagou-se da liberdade da forma e misturou prosa com poesia. Armando Freitas Filho, escritor e amigo íntimo de Ana, diz no prefácio de A teus pés: «A prioridade volta a ser pelo semântico, e se conteúdo e forma são mesmo dissociáveis, aquele é que determina esta. O resultado que daí advém é o de um texto quase sempre na primeira pessoa, confessional, que está próximo do formato do querido diário adolescente, que dialoga com um interlocutor mutante, misto de pessoa e personagem».</div><br /><div align="justify"></div><br /><div align="justify">A escritora de A teus pés ficou conhecida mundialmente, principalmente por fazer parte do livro 26 Poetas Hoje, organizado por Heloísa Buarque de Holanda, que foi sua professora. A fortuna crítica sobre a vida e a obra da escritora ainda é muito escassa, porém cada vez mais ela está se tornando referência nos estudos da literatura marginal, pois como disse Mariana Várzea em seu ensaio intitulado «Ana Cristina César ou o vôo da águia»: «Ana C. foi a própria encarnação da modernidade. Soube ser feminina sem ser feminista, sem estar ideologicamente presa a nada. Talvez por isso, tenha morrido cedo, fazendo sobre nossa terra uma passagem permanente. O lugar que ocupa como poeta é na linha do horizonte - virtual e veloz. Seu verso, que pertenceu à vertente cultivada da geração que apareceu em 70, é, hoje, a pedra fundamental de toda a poesia que se quer nova». E ainda hoje são encontrados escritos inéditos da poeta.</div><br /><div align="justify"></div><br /><div align="justify">Sua poesia é forte, cortante, as palavras que utiliza são suculentas, escorregadias: lubrificadas: «Olho muito tempo o corpo de um poema/ até perder de vista o que não seja corpo/ e sentir separado dentre os dentes/ um filete de sangue/ nas gengivas». Manuel Ricardo de Lima escreveu sobre a poeta: «Ana escreveu uma poesia que dialoga intensivamente com a página em que ela está sendo escrita, uma espécie de andamento musical, quase síncope». Armando Freitas Filho disse que Ana «queria pegar o pássaro sem interromper seu vôo», tentando, assim, chegar aonde não se chega em vida e portanto resolveu sair de cena deste mundo cedo para poder «perceber o invislumbrável no levíssimo que sobrevoava», e em 29 de outubro de 1983 se suicidou, criou asas para voar, como escreveu: «eu não sabia que virar pelo avesso era uma experiência mortal». A morte foi a solução para sua realização, para sua dúvidas, para seu vôo: «Não verei mais a lua de perto/ Talvez me irrite pisar no impisável/ E a morte deve ser gostosa/ Recheada com marchemélou/ Uma lâmpada queimada me contempla/ Eu dentro do templo chuto o tempo/ Uma só palavra me delineia/ VORAZ/ E em breve a sombra se dilui,/ Se perde o anjo». Essa foi Ana C. uma mulher que soube tornar-se arte em pessoa: «a ponto de partir, já sei/ que nossos olhos/ sorriam para sempre/ na distância./ Parece pouco?/ Chão de sal grosso, e ouro que se racha./ A ponto de partir, já sei que nossos olhos sorriem na distância/ lentes escuríssimas sob os pilotis». Sua poesia se mistura com sangue quente, é ardente e devoradora, ler sua arte literária é também tornar-se uma Ana.</div><br /><div align="justify"><br />Karine Bueno da Costa</div><br /><div align="justify">Acadêmica de Letras da FAFIUV</div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-57254382581699381632009-12-09T13:07:00.000-08:002009-12-09T13:08:41.282-08:00Uma querela Armorial-Tropicalista - urtiga! n°9<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhvIOHdO4TKtwKzSVjZ7Lef3z3iEyvxjIJ5J_1_0Y1nNBEry0Da7hANi0AQ94gt8f6zuUCEqmGpvp5mXM2Cvdy-JUZQIuaOswpeKEtSTMWKXlgUimFcg9KKyb5BCEXJYvGoZI9J3Di187s/s1600-h/arianosuassuna.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5413346342543641730" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 255px; CURSOR: hand; HEIGHT: 320px; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhvIOHdO4TKtwKzSVjZ7Lef3z3iEyvxjIJ5J_1_0Y1nNBEry0Da7hANi0AQ94gt8f6zuUCEqmGpvp5mXM2Cvdy-JUZQIuaOswpeKEtSTMWKXlgUimFcg9KKyb5BCEXJYvGoZI9J3Di187s/s320/arianosuassuna.jpg" border="0" /></a><br /><div align="justify">Protagonizada por dois grandes ícones da música e literatura (bem como dramaturgia e poesia – da vida cultural nacional), Ariano Suassuna e Caetano Veloso dividem o palco de uma velha briga entre tradição e vanguardismo.De um lado, Ariano Suassuna no auge de seus 82 anos de idade, sustentando o estandarte do Movimento Armorial (fundado na década de 70) e suas posições estéticas e políticas um tanto conservadoras.De outro, Caetano Veloso (67), um dos artistas mais polêmicos da contemporaneidade. Um dos idealizadores do Tropicalismo, movimento que agitou a vida intelectual do final da década de 60, principalmente pelo seu caráter experimental.A discussão gira em torno de um mote, a frase “É proibido proibir”, verso da canção de Caetano Veloso de mesmo título.Suassuna, em 1999, publica um artigo intitulado «Dostoiévski e o mal», em que critica severamente o que ele chama de irresponsável e mal formulado princípio amoral estabelecido por Sartre, posteriormente usado pelos tropicalistas.«Se Deus não existe, então tudo é permitido» diz Ivan Karamazov no livro Os Irmãos Karamazov. Ivan é um dos personagens dostoievskianos mais fascinantes. A trama do livro gira em torno de um parricídio, Karamazov [pai] possui três filhos: Dimítri, Ivan e Alieksei. Dimítri possui uma relação tempestuosa com o pai – que não chega necessariamente a ser uma pessoa muito compreensiva, quanto muito, provida de algum princípio moral – desde o início da juventude e o acusa de ter roubado sua herança, além de uma disputa pelo amor da prostituta Gruchenka. Ivan é calado, vive com o pai, mas não necessariamente chega a respeitá-lo como um ser humano. Alieksei era aprendiz do sacerdócio e desiste da vida a pedido do seu mentor.Sem nos deter na psique ou qualquer tentativa de análise psicológica dos personagens complexos de Dostoievski, resumamos a trama principal: Dimítri é acusado do assassinato do pai, no entanto, a voz que o teria instigado a fazê-lo é de Ivan.Ariano Suassuna, um assumido leitor e entusiasta do escritor russo, tira uma lição diferente da frase que levou Sartre, por exemplo, à filosofia existencialista: Logo, como nem tudo é permitido, Deus existe.Mas abandonemos aqui dos fatos de Deus, porque isso não nos compete, ou como diria o próprio Ivan Karamazov “De que adianta tentar explicar o que não é deste mundo?”. A crítica de Suassuna chama o tema “é proibido proibir” dos tropicalistas de leviano e tolo e termina seu artigo chegando à conclusão de que Hegel tinha razão ao considerar a arte, a religião e a filosofia sendo etapas do caminho em direção a Deus.Caetano Veloso, em novembro de 1999, responde a crítica no artigo «Dostoievski, Ariano e a Pernambucália» afirmando que o refrão “É proibido proibir” não pode ser tomado por outra coisa, que não um paradoxo irreverente e apesar de ele próprio se afirmar ateu, não se pode estender a sua preferência religiosa ao movimento tropicalista. Caetano, citando Sartre, observa que toda “moral” é um assunto entre homens, em que Deus não se intromete. E que justamente por ser um assunto humano, a existência da moral não prova a existência ou não de Deus, aliás, a manteria distante.Longe de uma conclusão, não existe vencedores numa discussão estética como essa já experimentada há anos. Como é o caso da Questão Coimbra, onde nossos patrícios dividiram o palco com a briga do tradicionalismo contra a vanguarda da época: românticos versus realistas, briga que ultrapassou os artigos, prefácios e ensaios partindo para um duelo entre Ramalho Ortigão pelos românticos contra Antero de Quental pelos realistas. Quanto a Suassuna e Cateano Veloso, ambos mantêm certa compostura de ambos os lados, embora não regulem na acidez do discurso.Seria interessante lembrar que, ambas as propostas dos movimentos Tropicalista e Armorial, sob um conceito geral, se baseiam na mesma coisa: «Antropofagia» – muito embora, Ariano provavelmente não admita o uso dessa palavra pela falta de simpatia que possui pelos modernistas antropófagos da década de 20. Enquanto o Tropicalismo realiza a antropofagia influenciada pelas correntes de vanguarda e pela cultura pop nacional e estrangeira, o Movimento Armorial preza pela erudição dos elementos populares, fundindo-os aos clássicos da literatura mundial.</div><br /><div align="justify"><br />Larissa Ceres Lagos</div><br /><div align="justify">Acadêmica de Letras da FAFIUV.</div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8780808134921249835.post-62647733885505855142009-12-09T13:04:00.000-08:002009-12-09T13:07:20.208-08:00Sonata ao Luar: 1° Movimento - Adágio Sostenuto - urtiga! n°9<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhrlv7x3lEcU7RG0mEYagWsg_AQzJWINspj-0X0AoxZhn1DUUCm7Sa94uJn9vgBHUtgw08pq__PIFgD8qPEAxeEZmHTD0PHA96AfZ5HHN88vYGPdW-K8JA0UpiZKMSwB2DPdOeP4U_sDTA/s1600-h/Rops_Les_Epaves_1866.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5413345730111669170" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 203px; CURSOR: hand; HEIGHT: 320px; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhrlv7x3lEcU7RG0mEYagWsg_AQzJWINspj-0X0AoxZhn1DUUCm7Sa94uJn9vgBHUtgw08pq__PIFgD8qPEAxeEZmHTD0PHA96AfZ5HHN88vYGPdW-K8JA0UpiZKMSwB2DPdOeP4U_sDTA/s320/Rops_Les_Epaves_1866.jpg" border="0" /></a><br /><div align="justify">O vento sopra ardentemente. O céu, qual manto lúgubre no túmulo cerúleo da noite, curva-se diante da onipresença do luar. Impiedoso, vibrante, mas tão gélido e distante... parece zombar timidamente de quem o contempla. Parece ser um vazio impreenchível, um vácuo interno que lateja incessantemente em sua caixa torácica. Parece ser uma luz fugaz que ilumina parcamente a alma insone. Parece, apenas parece...Os suspiros estrangulados do peito moribundo confundem-se com as maldições que são sussurradas pelo ar soprado entre os galhos taciturnos das árvores frondosas. As frases emudecidas que elas emanam são as mesmas que rutilam em seu cérebro, e sua surdez momentânea parece ser a antítese da razão pela qual somente ele consegue ouvi-las... esses presságios incógnitos, advindos da sapiência das bruxas evanescentes que esquivam-se nas sombras das asas noturnas... essas inspirações de musas distorcidas e encarniçadas pela embriaguez das trevas...O instrumento natimorto a sua frente sente as primeiras pulsações de vida. Os dedos quentes seguem pelas farfalhantes teclas. O enfadonho dedilhado do piano, que divide arpejos e marcações de notas duplas com a intensidade fraca, ressuscita a dor íntima. O passado, trancafiado em um baú negro, começa a ser exposto mentalmente, e acompanha de maneira sôfrega os olhos absortos nos movimentos de suas falanges. A fresta da janela nua, entreaberta, debatendo-se levemente ao andamento do vento, deixa que o luar novamente o atinja. O luar, este amaldiçoado e ao mesmo tempo abençoado companheiro da solidão dispersa, o único a acariciar sua face, o único a dividir o momento de silêncio – a pausa inquietante que rejubila-se ao ser esquartejada pelas notas aveludadas de uma melodia recolhida em acidentes musicais.Um rouxinol longínquo deixa seu canto rolar por sobre o silêncio noturno. Então, cordas trêmulas acompanham imaginariamente o seu instrumento, que prossegue melancolicamente, porém solícito ao mago que o faz cantar. Os metais arredondados surgem, mas sempre com uma humildade forçosamente triste. Todos os sons dos instrumentos crescem, os acordes do piano tornam-se mais fortes, e o desespero que é novamente acalmado pelas lágrimas dos violinos e violas não demora a se inquietar mais uma vez. Seus olhos brunos voltam-se para a pardacenta imagem que está atrás da janela. A tela, que transmite a paisagem adormecida pelo luar tenso, toma como moldura a sua alcova. O ambiente úmido e abandonado esquece-se, também, de seu próprio inquilino. Mesmo porque o ser hipnotizado pelo poder de Orfeu deixa de lado todas as suas necessidades, todos os seus anseios, todos os seus ardentes desejos, e deixa-se levar exclusivamente pela orquestração mental que lateja em seu cérebro.Seu coração palpita. Consegue sentir sua alteração rítmica em contraste com a calmaria de sua composição. O ansioso órgão denuncia emudecidamente a sua ansiedade diante daquela que parece querer engoli-lo a qualquer custo. A noite tenta sorver sua companhia, esmaga seus ossos com os dentes amortalhados da melancolia, e deglute a música composta somente para ela própria. Agora a escuridão ameaçadora quer acolhê-lo mais uma vez. Seus braços macabros estendem-se ao seu redor como os braços afáveis de uma mãe que quer confortar desesperadamente o seu rebento. Nesse abraço íntimo, quer cantar-lhe uma berceuse desvelada, e seu primogênito então reclama: “Canção de ninar? Não! Quero uma sonata...” O sono, aos poucos, vai conquistando o indivíduo a prantear em silêncio. Sua respiração torna-se lenta, densa e escura... está a inalar a atmosfera tóxica que criara imaginariamente ao exumar os pesadelos sepultados como indigentes. A exaustão da carne é a exposição do seu tema principal, quando planeja o ritardando do piano até a morte da melodia, e após breve pausa, as cordas e madeiras exalam dois últimos suspiros de quem adormece e pranteia em silêncio. </div><br /><div align="justify"></div><br /><div align="justify">Emili Albuquerque<br />Acadêmica de Letras da FAFIUV</div><div align="justify"> </div><div align="justify">Imagem: Capade Felicien Rops para Flores do Mal, de Baudelaire</div>Urtiga!http://www.blogger.com/profile/07135717347366848944noreply@blogger.com0